“Adoção e família: a preferência pela faixa etária, certezas e incertezas”, de Rosana Maria Souza de Barros

Resenha por Maria Angela D’Incao

As Escolhas no Processo de Adoção

O volume Adoção e família – a preferência pela faixa etária, certezas e incertezas, de Rosana Barros, encerra um estudo que originalmente foi dissertação de mestrado no programa de Pós-graduação em Serviço Social da Universidade Federal do Pará (UFPA). Um trabalho de importância, bem-vindo para o enfrentamento da questão social do abandono de crianças não desejadas pelas mães em nosso país.
Trata-se de uma investigação que procura abordar a adoção do ponto de vista dos profissionais envolvidos no Judiciário e também dos pais, enfocando, assim, as falas e opiniões desses atores, as quais revelam vários aspectos dos seus sentimentos e concepções no que se refere à adoção e à idade da criança a ser adotada.
A autora divide seus estudos em quatro capítulos. No primeiro, apresenta seus propósitos, o universo da pesquisa e metodologia a ser utilizada; no segundo, “Discutindo a adoção”, fornece ao leitor as bases de suas leituras teóricas e informações sobre as questões jurídicas envolvidas, além de construir uma orientação bastante elucidativa da pesquisa; no terceiro, “A escolha da faixa etária segundo os profissionais da área”, Barros mostra os resultados das entrevistas e propõe certa sistematização entre dois tipos de adotantes: os que procuram crianças de até dois anos e os que aceitariam adotar crianças mais velhas. Há falas bastante elucidativas que revelam o desejo dos diferentes candidatos à adoção. Finalmente, no quarto capítulo, “A adoção tardia: procurando desvendar certezas e incertezas”, contribui de modo significativo para as questões que cercam as adoções de um modo geral, a partir de suas pesquisas.
Entender que a família a ser construída com filhos adotivos se pautará pelos aspectos constitutivos da família burguesa ou nuclear é importante, uma vez que esse modelo irá interferir nas possíveis adoções. A crença de que o amor só se fará presente nas relações familiares com consanguinidade e longo tempo de convivência induz a procura por crianças menores. E não poderia ser de outra forma. Como relembra o estudo, a hegemonia desse modelo baseado no discurso do amor como razão de ser da família nuclear burguesa atua sobre o ato de adoção.
E aí a autora revela aspectos importantes da fragilidade desse modelo para a adoção. As mentalidades envolvidas nos processos de adoção, na sociedade contemporânea, favorecem a permanência de crianças maiores nos serviços de acolhimento, pois não preenchem as expectativas dos adotantes, nem mesmo do Judiciário.
A busca por filhos se revela como a busca de uma completude da família. Uma família sem a presença do exercício da maternidade é percebida como incompleta. Isso vem a interferir na escolha das idades apropriadas para a adoção. A escolha por crianças menores de dois anos indica que o modelo internalizado de família, pelas mães adotantes, nos casos estudados, é o da família nuclear moderna, em que prevalece o amor. Para tal, compreendem os adotantes, é preciso haver laços consanguíneos e adotar crianças menores é o que mais os aproxima desse ideal. Outro fator relevante, nos casos estudados, é a crença de que crianças menores ainda não sofreram as dores advindas da vivência em abrigos e da distância da convivência familiar e outros sofrimentos, podendo ser um membro familiar inteiro e sem heranças desagradáveis e dolorosas.
Esse volume é bem-vindo não somente para os estudos de família, como também para as instituições que trabalham com a adoção, desde serviços de acolhimento de crianças e adolescentes até as assistências sociais públicas e particulares. Além disso, trata-se de um importante trabalho para ser lido nos setores judiciais, que poderiam se cercar de mais estudos para a compreensão da questão da adoção no Brasil. A autora indica, assim, caminhos para que esses serviços sejam mais capazes de compreender a problemática da adoção de crianças de qualquer idade, nesse imenso país, onde a prevalência de lares sem a presença dos pais é expressiva. O Judiciário precisaria se cercar de especialistas nas questões familiares.
Desse modo, a maior dificuldade para a adoção, no Brasil, vem a ser o fato de que restam crianças que não são brancas, que têm irmãos e que são crescidas ou mais velhas. Além, é claro, daquelas com necessidades especiais.
Quem frequentou serviços de acolhimento de crianças e adolescentes sabe da rotina que se verifica sempre que uma pessoa chega para uma visita ou para doações. As crianças cercam o visitante e perguntam: você é minha mãe? Vai me levar para a sua casa? Por que não me leva com você? Há um anseio enorme entre as crianças de qualquer serviço de acolhimento de sair da instituição e ter uma família.
Ao evidenciar a questão das mentalidades, o estudo feito por Barros poderá levar a outros estudos e a políticas públicas que possam equacionar essa aversão por crianças maiores. O que mostram os estudos sobre famílias, no Brasil, do ponto de vista da incorporação ou adoção de novos membros à família? Que se as classes altas e médias têm dificuldade de incorporar crianças maiores, não brancas e com vários irmãos, caberiam políticas públicas não só para elas, principalmente, como também para as demais.

Referência

BARROS, Rosana Maria Souza de. Adoção e família: a preferência pela faixa etária, certezas e incertezas. Curitiba: Juruá Editora, 2014. 146 p.

Maria Angela D’Incao Professora colaboradora no Programa de pós-graduação em Geografia da Universidade Estadual Paulista (UNESP), Faculdade de Ciências e Tecnologia (FCT)