“Pensar la infancia desde América Latina: un estado de la cuestión”, Valeria Llobet (coord.)¹

 

O livro começa com um sugestivo prólogo escrito por Diana Marre, no qual se faz uma reconstrução histórica do conceito e da categoria de infância, desde a clássica obra de Ariés até a atualidade. Para tal, recuperam-se dois eixos centrais: a historicidade da categoria infância e a interdisciplinaridade.
Na introdução feita por Sara Victoria Alvarado e Valeria Llobet, anuncia-se a complexidade que consiste pensar as infâncias e as juventudes no contexto latino-americano, sustentando a necessidade de propor a reflexão, considerando a pluralização da infância e atendendo à multiplicidade de experiências e modos de vida de meninos e meninas. Essas pluralidade e heterogeneidade não emergem somente do lado das crianças, mas também do interlocutor “pensante” da região, cruzando diferentes perspectivas disciplinares, modos de construção dos objetos de investigação e maneiras de reconstrução dos contextos sociopolíticos e históricos.
A publicação se divide em três partes, com ênfase nos contextos, modos de produção da infância e nas instituições e políticas na América Latina.
Na primeira parte, temos o artigo de María Camila Ospina-Alvarado, Sara Victoria Alvarado e Héctor Fabio Ospina, no qual refletem sobre a “Construção social da infância em contextos de conflito armado na Colômbia”. O leitor encontrará aqui uma análise construtivista centrada nas crianças que vivem e/ou têm vivido  no contexto do conflito armado na Colômbia, direta ou indiretamente. O foco está na construção social gerada através das interações dos meninos e meninas com outros atores, entre os quais sobressaem as famílias, os pares, os grupos armados legais e ilegais, os docentes, os agentes comunitários. Os autores apresentam uma compreensão sistêmica e complexa dessas crianças, a partir do reconhecimento de seus recursos e potenciais individuais e coletivos.
No artigo seguinte, René Unda Lara e Daniel Llanos Erazo escrevem sobre a “Produção social de infâncias em contextos de mudanças e transformações ’rurbanas‘ (resultado da mescla das palavras ‘rural’ e ‘urbanas’). Exploram nesse texto as continuidades, mudanças, rupturas e transformações que operam no contexto de sociedades nas quais a diferenciação entre o rural e o urbano expressa misturas, hibridações e heterogeneidades, que favorecem novas geografias físicas e sociais. Recupera-se a visibilidade crescente da infância em um contexto que localiza o urbano e a acumulação econômica como equivalentes à felicidade e à liberdade, o que incitaria meninos e meninas a deixarem de ser crianças o quanto antes para migrar até a cidade e desfrutar dos benefícios que as grandes urbes supostamente asseguram, ao mesmo tempo em que promoveria uma pretendida liberação dos adultos da comunidade.
Na segunda parte, denominada “Narrativa, discurso e cultura. Compreensão e produção de ‘infância’ e do infantil”, Marieta Quintero Mejía, Jennifer Mateus Malaver e Natalia Montaño Peña realizam um sugestivo trabalho sobre as narrativas do dano moral de crianças em experiências extremas. Sustentam que essas experiências não só estão presentes nos relatos de tragédias, mas que se fazem concretas nas narrativas contemporâneas de meninos e meninas. Esses relatos apresentam como particularidade o fato de desnudarem a crueldade humana, o grau de precariedade, o mal-estar e a dor na vida comunitária. Relatos que se articulam com as representações da infância que remarcam a natureza frágil e vulnerável como qualidade “natural” de tais sujeitos, e com o grau de indefensibilidade dos meninos e meninas em relação a seus vitimários, isto é, às situações de desigualdades geracionais.
De sua parte, Isabel Orofino, em seu artigo “Mídias, culturas e infâncias: reflexões sobre crianças, consumo cultural e participação”, reflete sobre o entrecruzamento das infâncias e os meios de comunicação a partir de aportes teórico-metodológicos que tomam como ponto de partida a compreensão das crianças como atores sociais, inseridos em contextos particulares. O eixo de análise se coloca sobre crianças que aparecem cada vez mais atravessadas pela crescente midiatização de conteúdos que não foram especificamente produzidos para esse público.
Em seguida, María Edith Stephani Chacón Bustillos, em seu texto “Infâncias e saberes especialistas. O olhar da infância a partir das teses de graduação de Psicologia”, investiga de que maneira a infância se realiza no discurso da Psicologia como o discurso especialista por excelência, conseguindo assumir o lugar de interlocução privilegiada da infância. Para isso, explora a institucionalização do âmbito acadêmico universitário de Psicologia enquanto espaço habilitador para a acreditação e reconhecimento dos especialistas, mediante a análise das teses de graduação que os estudantes escrevem para obter seu título acadêmico.

Gabriela Magistris gabrielamagistris@gmail.com Professora em Ciências Jurídicas (Universidade de Buenos Aires, Argentina). Mestre em Direitos Humanos e Políticas Sociais (Universidade Nacional de San Martín, Argentina), doutoranda em Ciências Sociais (Universidade de Buenos Aires, Argentina).