Editorial – Ed. 14

A noção ‘juventude’ invoca hoje um campo plural que compreende uma diversidade de definições e teorias sobre a especificidade do ser jovem. A própria definição de juventude proposta por organismos internacionais, como a UNESCO, tem sofrido revisões, o que mostra, no mínimo, a elasticidade e a efemeridade dos critérios que se julgam relevantes para delimitar este campo de estudos. Por outro lado, os movimentos juvenis nos espaços públicos, antes circunscritos às lutas estudantis, principalmente de universitários, hoje, se diversificam em torno de demandas e reivindicações culturais, de gênero, etnia e outras tantas, rearticulando a agenda de lutas da categoria ‘juventude’ frente à sociedade, e alavancando a organização de grupos e associações juvenis (Balardini, 2000).

Alinhados com os novos tempos, outros atores sociais, como os governos, por exemplo, vêm, gradualmente, consolidando agências destinadas a formular políticas públicas específicas para a juventude com programas e metas dirigidas aos jovens. Neste sentido, ganha relevância o fato de tais políticas estabelecerem suas próprias definições sobre a juventude, no momento em que os jovens passam a ser um campo de intervenção social visibilizado politicamente.

A visibilidade que a ‘juventude’ vem adquirindo nos espaços públicos de lutas e demandas tem favorecido, também, a ampla mobilização do Terceiro Setor (Ongs, fundações privadas e públicas, OSCIPs), cuja vertiginosa expansão no Brasil tem se ocupado, crescentemente, dos segmentos juvenis. De acordo com dados do Censo promovido pelo GIFE (Grupo de Instituições, Fundações e Empresas), que aglutina as maiores empresas e bancos privados no Brasil, os jovens – entre 15 e 24 anos – compõem um dos destinos que mais recebe o investimento social privado deste grupo (GIFE, 2014).

Neste cenário de intensa movimentação de grupos juvenis, governo, instituições públicas e privadas, é de se esperar que uma multiplicidade de visões concorrentes procure, cada uma, definir a ‘realidade juvenil’. Consequentemente, a diversidade discursiva sobre ‘a’ e ‘as’ juventude (s) não alcança, muitas vezes, nem integração, muito menos coerência; ou, até mesmo, consegue propiciar diálogo que instaure uma maior compreensão sobre as diferenças e distâncias entre as distintas concepções.

Como têm se posicionado as ciências humanas e sociais a esse respeito? Como as ciências, a Psicologia, a Sociologia, a Antropologia e a Educação, para nomear apenas algumas delas, têm respondido aos desafios colocados por este cenário? De que forma as trajetórias específicas de cada uma dessas disciplinas ao longo do século XX determinam o modo como, hoje, elas definem o objeto de estudo ‘juventude(s)’, e elegem o escopo relevante de temas e questões de investigação? Como tais itinerários disciplinares, desenhados ao longo de décadas, vão privilegiar determinadas conceituações em detrimento de outras, e encaminhar determinadas orientações e políticas no atendimento às demandas destes segmentos? E ainda, será possível e desejável estabelecer articulações transdisciplinares nas pesquisas deste campo de estudos?

Nesta edição da DESIDADES, três artigos da seção Temas em Destaque trazem uma contribuição a este debate. Luís Antonio Groppo, em “Juventudes e políticas públicas: comentários sobre as concepções sociológicas de juventude” analisa como as teorias sociológicas, construídas ao longo do século XX, vão impactar o campo recente das políticas públicas para a juventude . Márcia Stengel e Juarez Dayrell, por sua vez, em “Produção sobre Adolescência/Juventude na pós-graduação da Psicologia no Brasil”, se voltam para a produção discente da pós-graduação brasileira em Psicologia, entre 2006 e 2011, para mapear os estudos sobre adolescência e juventude. Voltando as lentes de análise para os próprios jovens, sua produção cultural e movimentos de resistência, Mirela Iriart e Denise Laranjeira, em “Pesquisando nas fronteiras: cartografias de circuitos culturais juvenis em Feira de Santana – BA/Brasil”, buscam capturar, por meio do método cartográfico, as expressões culturais de grupos juvenis no seu movimento liminar de reconfiguração das redes urbanas de solidariedade e reconhecimento social.

Na seção Espaço Aberto, a pesquisadora Ilana Lemos de Paiva, da Universidade Federal do Rio Grande do Norte, entrevista a pesquisadora mexicana Juana María Guadalupe Mejía-Hernández sobre Violência entre adolescentes no contexto escolar. Atualmente Juana Mejia-Hernandez é docente na Universidade Tecnológica do México (UNITEC), e no Centro Universitario ORT – México tendo realizado uma extensa pesquisa com adolescentes mexicanos nas escolas públicas.

Na seção Informações Bibliográficas contamos com a resenha de Ana Maria Fonseca de Almeida sobre o livro de autoria da pesquisadora argentina Victoria Gessagh, La educación de la clase alta argentina – entre la herencia y el mérito. Apresentamos, ainda, nesta seção a lista de 22 publicações recentes nas ciências humanas e sociais, relativas ao último trimestre sobre infância e juventude, como resultado do trabalho de busca sistemática realizado pela revista nos sites das editoras, comerciais e públicas, em todos os países da América Latina. Portanto, esta edição da revista contempla de modo especial a discussão sobre juventude e adolescência nos seus múltiplos e interessantes aspectos que contemporaneamente instigam a pesquisa científica e servem de base a políticas de governos e ações das sociedades.

Boa leitura!

 

Lucia Rabello de Castro

Editora Chefe

 

Referências Bibliográficas

BALARDINI, S. (Comp.) La participación social y política de los jóvenes en el horizonte del nuevo siglo. Buenos Aires: CLACSO, 2000.

GIFE/BRASIL. Censo GIFE, 2014. Disponível em: http://gife.org.br/censo-gife/. Acesso em: 3 mar. 2017