Líder jovem Guarani-Kaiowá.

A educação dos jovens Guarani e Kaiowá e sua utilização das redes sociais na luta por direitos.

O presente artigo apresenta os processos de educação indígena Guarani e Kaiowá bem como a luta política inédita dos jovens indígenas através das redes sociais (Facebook) na internet, buscando as efetivações de seus direitos fundamentais no contexto contemporâneo.
O povo Guarani e Kaiowá em foco é conhecido na literatura antropológica como sendo Guarani-Kaiowá e Guarani-Ñandéva (ver Schaden, 1974; Melià; Grünberg e Grünberg, 1976). Embora apresentem muitos aspectos culturais e de organização social em comum, o primeiro, ou seja, Guarani-Kaiowá, não se reconhece como sendo Guarani, mas aceita a denominação de Kaiowá. Por sua vez o Guarani-Ñandéva se autodenomina como Guarani. Assim sendo, no decorrer deste artigo irei me referir ao povo indígena como Guarani e Kaiowá.
Para a fundamentação deste artigo inicialmente apoiei-me na bibliografia que trata especificamente da história do povo Guarani e Kaiowá. Em parte, para analisar a luta política dos jovens indígenas contemporâneos, centrei-me nos trechos do documento escrito divulgado do 1º Encontro dos Jovens Indígenas Guarani e Kaiowá, realizado em 2011. Por fim, em geral considerei os relatos, os vídeos, fotos, petições e os documentos indígenas postados nas redes sociais (Facebook e blogs) por representantes dos jovens Guarani e Kaiowá que foram fundamentais para a elaboração deste artigo.
A literatura, tanto antropológica como historiográfica, aponta que desde a época pré-hispânica, o atual território brasileiro e paraguaio encontrava-se povoado por indígenas pertencentes ao tronco Tupi-Guarani, segundo Susnik (1979, p. 80).
É importante revelar que até hoje estes subgrupos (Guarani Kaiowá, Ñandéva, Mbya) remanescentes do tronco Tupi-Guarani vivem dispersos em pequenos pedaços de seus territórios localizados no Brasil, Paraguai, Argentina e Bolívia. Essa diversidade de subgrupos Guarani contemporâneos se constituem como categorias étnicas diferenciadas. São considerados pela literatura antropológica como povos agricultores, religiosos/rezadores e guerreiros, que se encontram em certa medida em processo de disputa e conflito com os colonizadores dominantes até hoje. Esses fatos históricos ainda são poucos conhecidos pelos não indígenas do Brasil, entre outros.
Atualmente, no Brasil, os povos Guarani estão localizados em diversas regiões. O povo Guarani-Mbya (na região Sul) está concentrado nos estados do Rio Grande do Sul, Santa Catarina e Paraná; na região Sudeste, em São Paulo, Rio de Janeiro e Espírito Santo. Os Guarani-Ñandéva e Kaiowá concentram-se na região Centro-Oeste no estado de Mato Grosso do Sul.
Os povos indígenas do atual Cone Sul de Mato Grosso do Sul formam uma população de, aproximadamente, 46.000 indivíduos, que pertencem às etnias Guarani Kaiowá; 60% dessa população são jovens, a maior parte está distribuída em oito aldeias ou postos indígenas (demarcadas pelo Serviço de Proteção aos Índios entre 1915 e 1928); outra parcela da população Guarani e Kaiowá está assentada em 22 terras indígenas reocupadas pelos próprios indígenas, as quais se encontram identificadas e demarcadas ou em processo de regularização fundiária pelo governo federal a partir das décadas de 1980, 1990 e 2000. Além disso, existem oito grupos de comunidades ou conjuntos das famílias extensas acampadas de modo provisório na margem da rodovia (BR), aguardando identificação e reconhecimento oficial do seu território tradicional tekoha guasu.

A organização social dos indígenas Guarani e Kaiowá e os sentidos da educação nestes povos

Em relação à referida organização social desses indígenas, os estudos antropológicos recentes (como Meliá, 1978; Thomaz de Almeida, 1991; Mura, 2006) confirmam que os subgrupos Guarani Kaiowá, Ñandéva e Mbya continuam sua organização social centrada na família extensa.
No passado, uma família extensa indígena composta por mais de uma centena de índios vivia dentro de uma casa grande, sendo que nesta habitação e no seu entorno os adultos trabalhavam, juntamente com os jovens e as crianças, sendo as atividades cotidianas divididas segundo o sexo e a idade. Com o passar do tempo, o desaparecimento da casa grande não significou uma mudança na centralidade desta organização social.
No seio da família extensa Guarani e Kaiowá, as crianças maiores cuidam das menores, de modo que todas são educadas juntas nestes mesmos espaços, por meio de práticas educativas que servem para todas as crianças, até 13 anos de idade, de ambos os sexos. Assim, no entendimento dos Guarani e Kaiowá, a fase final da criança é compreendida até 13 anos de idade.
Na concepção dos Guarani e Kaiowá, a fase do jovem começa a partir de 14 anos de idade, o menino com a mudança de voz e a menina com a primeira menstruação. Sendo assim, passam para outra fase, ainda não adultos, mas se preparando para a fase adulta, o que ocorre mais ou menos após os 14 anos de idade. Com a mudança de voz, o menino é liberado pela mãe e a avó para acompanhar os homens.
Um processo semelhante ocorre com a menina, mas obviamente de modo distinto e mais rígido também. Após a primeira menstruação, a menina não deve mais interagir sozinha com qualquer menino que possui idade superior a ela. A primeira menstruação é marco fundamental para a menina se tornar jovem, iniciando a fase adulta, devendo permanecer sob orientação da avó e da mãe ao longo do processo de experiência adulta.

Tonico Benites tonicobenites2011@hotmail.com

Tonico Benites, Ava Verá Arandú, é indígena Guarani e Kaiowá, tradutor e porta voz da Assembléia Geral (Aty Guasu) do povo Guarani e Kaiowá. Licenciado em Pedagogia pela Universidade Estadual de Mato Grosso do Sul. Mestre e Doutor em Antropologia Social pelo Programa de Pós-Graduação em Antropologia Social do Museu Nacional/UFRJ. Desde 2013 é professor na Faculdade Intercultural Indígena, da Universidade Federal da Grande Dourados.