Foto: Gustavo e Otávio Pandolfo - OSGEMEOS

Produção sobre adolescência/juventude na pós-graduação da Psicologia brasileira

Considerações finais

 

Esta pesquisa nos possibilitou traçar um perfil da produção sobre adolescência/juventude na pós-graduação “stricto sensu” da Psicologia. Entre 2006-2011 foram produzidas cerca de 5.300 teses/dissertações, das quais aproximadamente 10% trabalharam com a temática da adolescência/juventude, o que não é um número desprezível.

 

Como apontamos na metodologia, muitas teses/dissertações foram eliminadas da pesquisa pelo fato de que boa parte dos trabalhos não contemplavam os termos adolescência/adolescente nem juventude/jovem nos títulos e/ou nas palavras-chave. Muitos deles, mesmo fazendo essa referência, não focavam nos universitários ou estudantes do ensino médio enquanto sujeitos da investigação. Significa dizer que o foco do trabalho não era o adolescente/jovem propriamente dito, mas o tema investigado, e a pesquisa pouco contribuía para ampliar o conhecimento a respeito dos sujeitos pesquisados. Isso sinaliza para a necessidade de pesquisarmos adolescentes/jovens em uma relação mais igualitária, ou seja, colocando-os na posição de sujeito da pesquisa e não objeto. Essa perspectiva pode favorecer um conhecimento mais apurado sobre adolescência/juventude.

 

Chamou-nos a atenção o expressivo número de categorias temáticas e, dentre estas, os subtemas presentes. Foi realizado grande esforço para reduzir ao mínimo esse número para que não houvesse dispersão e para que as teses/dissertações pudessem ser agrupadas com mais propriedade, permitindo um diálogo entre elas. Entretanto, constatamos a impossibilidade de tal condensação devido à amplitude temática, que produz uma desagregação no debate sobre adolescência/juventude. Observamos teses/dissertações com focos e objetivos similares, utilizando referenciais teóricos semelhantes e mesmas metodologias. Estas foram preponderantemente as de cunho qualitativo, com pouca expressão das quantitativas. Entre as primeiras, o método mais empregado foi entrevista semiestruturada, seguido de estudo de casos. Os métodos utilizados são os que aparecem com frequência nas pesquisas na área da Psicologia.

 

As semelhanças se presentificam até nos títulos, que são parecidos em muitos trabalhos. Isto nos faz pensar na repetição presente nas pesquisas, o que, além de um diálogo, impede, ou ao menos dificulta, um adensamento teórico relativo à temática na Psicologia. Essa dispersão concatena-se com outro ponto observado: trabalhos muito mais descritivos que explicativos. Por exemplo, a compreensão de quem é o sujeito adolescente/jovem numa perspectiva psíquica, à primeira vista, aparece pouco, não havendo uma teoria ou reflexividade mais consistente sobre o processo adolescente. Por isso, também há certa reprodução das teorias utilizadas, sem grandes avanços.

 

O resultado desta pesquisa abre frentes para outros trabalhos, como melhor compreensão e distinção entre as categorias adolescência e juventude no campo da Psicologia. A incorporação mais recente da segunda categoria e, aparentemente, ainda sem reflexão aprofundada pode ter sido um dificultador para essa separação. Para tanto, faz-se necessário um trabalho mais minucioso, com a leitura cuidadosa de teses/dissertações. Todavia, a pesquisa realizada permite-nos algumas proposições. A primeira é que há uma distinção entre as categorias adolescência e juventude. Para haver uma interseção, ou quem sabe, uma terceira categoria que abarcasse as duas, ainda se fazem necessários muitos debates e aprofundamentos. Por isso, acreditamos que o uso das categorias deve ser feito com mais rigor, sem que haja superposição entre elas ou seu uso indiscriminado, como vimos em várias teses/dissertações, com os termos adolescente e jovem usados como sinônimos ou até mesmo um deles no título e outro nas palavras-chave.

 

A definição etária de adolescência e juventude não é suficiente para fazermos a diferença entre elas. Inclusive, se nos pautarmos nos Estatuto da Criança e do Adolescente (1990) e Estatuto da Juventude (2013), vemos uma dificuldade, já que o primeiro aponta que a adolescência se situa entre os 12 e 18 anos e o segundo marca a juventude como sendo entre 15 e 29 anos. Ou seja, o intervalo etário entre 15 e 18 anos está abarcado nos dois Estatutos, o que nos traz a pergunta: esse sujeito então é adolescente ou jovem? Em qual categoria o alocamos? Se pensarmos nas políticas públicas e sociais, ele participará de qual delas, a voltada para adolescência ou a para a juventude? Nos trabalhos mais específicos da Psicologia, como a clínica, por exemplo, como compreenderemos esse sujeito?

 

A relação entre adolescência e juventude é possível, pois não devemos pensá-las como  excludentes, mas complementares. Como articulá-las, promovendo um avanço nesta discussão, é um desafio para os estudos da Psicologia.

 

Outra frente é investigarmos mais aprofundadamente as temáticas escolhidas e como elas vêm sendo trabalhadas. Para tanto, é necessária uma pesquisa que vá além da análise dos resumos das teses/dissertações, contemplando a leitura cuidadosa de uma seleção representativa delas, dada a impossibilidade da análise de seu conjunto completo.

 

Referências Bibliográficas

 

Sposito, M. P. (Org.). O Estado da Arte sobre juventude na pós-graduação brasileira: Educação, Ciências Sociais e Serviço Social (1999-2006). Belo Horizonte: ARGVMENTVM, 2009.

 

Sposito, M. P. (Org.). Juventude e Escolarização (1980-1998). Brasília-DF, MEC/Inep/Comped, 2002.

 

Resumo

 

Pela importância dos estudos sobre adolescência/juventude na Psicologia, desenvolvemos uma pesquisa cujo objetivo era analisar e sistematizar o uso das categorias adolescência e juventude na produção discente da Pós-Graduação stricto sensu em Psicologia, entre os anos de 2006-2011, e as temáticas recorrentes. Ela consistiu em um estado da arte sobre essa produção. Este tipo de estudo possibilita a sistematização de um determinado campo de conhecimento a partir de um recorte temporal fixado. Partindo de um roteiro de leitura, selecionamos 483 trabalhos que tinham adolescentes/jovens como sujeitos ou foco do estudo e os agrupamos, por frequência simples, em dezenove categorias temáticas. Os temas com maior número de trabalhos foram Violência e Família. Observamos uma repetição nas pesquisas, o que, além de um diálogo, impede, ou ao menos dificulta, um adensamento teórico relativo à temática na Psicologia.

 

Palavras-chave: estado da arte, adolescência, juventude, psicologia.

 

 

Data de recebimento: 27/02/16

 

Data de aprovação: 06/12/16

Márcia Stengel marciastengel@gmail.com

Doutora em Ciências Sociais pela Universidade Estadual do Rio de Janeiro (UERJ), com pós-doutorado em Educação pela Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG), Mestre em Psicologia Social pela mesma instituição. Professora do Programa de Pós-graduação de Psicologia da Pontifícia Universidade Católica de Minas Gerais.

Juarez T. Dayrell juareztd@gmail.com

Doutor em Educação pela Universidade de São Paulo (USP), com pós-doutorado no Instituto de Ciências Sociais da Universidade de Lisboa (ICS). Professor associado da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG), e pesquisador do CNPq (Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico). Fundador membro do Observatório da Juventude da UFMG.