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Violência e namoro na adolescência: uma revisão de literatura

Introdução

O fenômeno da violência no namoro ainda é pouco estudado no Brasil ao se comparar com a produção da literatura internacional sobre a temática (Minayo; Assis; Njaine, 2011; Cecheto; Oliveira; Njaine; Minayo, 2016). O presente artigo objetiva analisar a produção científica sobre a violência no namoro entre adolescentes nos idiomas português e espanhol, no período que compreende os anos de 2006 a 2016.

O CDC (Centers for Disease Control and Prevention) dos Estados Unidos aponta que a violência no namoro entre adolescentes refere-se à: 1) violência física – ocorre quando o parceiro(a) utiliza a força física contra o outro; 2) sexual – forçar o parceiro(a) a relacionar-se intimamente sem consentimento; 3) psicológica ou emocional – ameaçar, insultar e controlar o parceiro(a) (esta pode ser denominada também de violência verbal ou verbal-emocional); e 4) perseguição – diz respeito a assediar sucessivamente o parceiro(a), provocando medo e ansiedade pela presença indesejada. A vivência de um namoro violento pode desencadear sintomas como: depressão, ansiedade, abuso de álcool e drogas, comportamentos antissociais e ideação suicida. Assim, é vista como um problema de saúde pública que apresenta consequências a curto e longo prazo para o adolescente em desenvolvimento (CDC, 2016).

No panorama nacional, a respeito dos impactos de perpetrar e ser vítima (ou ainda ambos os casos) de um namoro violento, as pesquisadoras brasileiras Diniz e Alves (2015) ressaltam que não se tem ainda, no país, conhecimento sobre as consequências em curto, médio e longo prazo desse tipo de violência na adolescência.

Uma pesquisa pioneira investigou a violência nas relações afetivo-sexuais, ficar ou namorar, entre adolescentes, no cenário nacional, em dez capitais brasileiras. Participaram do estudo 3.200 alunos na faixa etária de 15 a 19 anos de 104 escolas públicas e privadas entre os anos 2007 e 2009. A investigação aponta que a maioria das meninas e dos meninos, 76,6%, simultaneamente perpetra e sofre vários tipos de violência no relacionamento, dados que corroboram as pesquisas internacionais. Na violência verbal, esse número sobe para 96,9%. Na tipologia violência física, 64,1% dos estudantes agridem e também são agredidos fisicamente por seus parceiros(as) (Minayo et al., 2011). Nesse contexto, a violência no namoro entre adolescentes é considerada uma forma de violência de gênero, pois “envolve relações de dominação/subordinação determinadas pela construção histórica e social da masculinidade e feminilidade hegemônicas” (Brancaglioni; Fonseca, 2016, p. 953).

A Organização Mundial de Saúde (OMS) considera que a violência no namoro entre jovens é uma forma prematura da violência conjugal. Diante disso, aponta que os programas de prevenção da violência no namoro constituem uma das evidências para a prevenção da violência juvenil. Essas intervenções contribuem para o desenvolvimento de relações amorosas mais saudáveis com a utilização de estratégias para resolução de conflitos não violentos. Entretanto, grande parte dessas evidências é realizada em países desenvolvidos, como Estados Unidos e Canadá (OMS, 2016).

É na adolescência que as relações de amizade e de namoro ganham maior importância, a família vai cedendo espaço para a construção de outros relacionamentos e interações. É nessa fase do ciclo do desenvolvimento que “o comportamento dos adolescentes resulta de uma interação complexa entre processos pessoais, relacionais, transgeracionais e sociais” (Diniz; Alves, 2015, p. 39). Dessa forma, diante da relevância do tema, torna-se significativo conhecer as pesquisas realizadas sobre o assunto.

Metodologia

O presente artigo é uma revisão sistemática do conhecimento científico acerca do fenômeno violência no namoro na adolescência, contemplando estudos publicados no idioma português e espanhol, em periódicos, nas seguintes bases de dados bibliográficas: SciELO, PePSIC, LILACS e Periódicos CAPES. A revisão sistemática é uma investigação com foco em uma questão definida que objetiva selecionar, avaliar e compilar os estudos disponíveis acerca de determinado tema. Trata-se, assim, de estudos secundários, que encontram, nos estudos primários (artigos científicos), sua fonte de dados (Galvão; Pereira, 2014; Castro, 2001).

A revisão foi realizada através da busca eletrônica de artigos indexados nas bases acima citadas, a partir dos descritores previamente selecionados no DeCS (Descritores em Ciências da Saúde): “violência” e “adolescência”. Empregou-se também o termo livre “namoro”, não encontrado no DeCS, mas de extrema relevância para a pesquisa. Os descritores equivalentes em espanhol utilizados foram “violencia”, “adolescencia” e “noviazgo1”. Para otimizar a busca dos artigos, os descritores acompanharam o termo livre e, em seguida, apenas o termo livre. Como complemento da estratégia de busca, foi utilizado o operador booleano “AND”. Dessa forma, apresentaram-se as seguintes combinações: “violência and namoro”; “adolescência and namoro”; “namoro” e “violencia and noviazgo”; “adolescência and noviazgo”; “noviazgo”.

O período definido para a produção deste estudo compreendeu as publicações dos anos entre 2006 e 2016, limitando-se até o dia 12 de dezembro de 2016. Os artigos pesquisados poderiam estar sob a ótica de diferentes abordagens teóricas da psicologia e de qualquer área do conhecimento, como exemplo, saúde pública, enfermagem, educação entre outras.

Os critérios adotados para a inclusão foram: qualquer tipologia de violência ocorrida no âmbito do namoro de adolescentes; violência no namoro retratada em qualquer área do conhecimento; e o público-alvo da pesquisa compreendendo a faixa etária entre 10 e 19 anos. Os artigos publicados fora do período selecionado, artigos de revisões teóricas ou análise documental, além de artigos que não compreendiam a idade limite de 19 anos foram os critérios adotados para sua exclusão dos artigos.

1 – Palavra traduzida como namoro ou noivado.
Thais Afonso Andrade t.afonsoandrade@yahoo.com

Mestre em Psicologia Clínica pela Universidade Católica de Pernambuco (UNICAP). Psicóloga pela Pontifícia Universidade Católica de Minas Gerais (PUC Minas). Membro do Núcleo de Estudo e Pesquisa sobre as Juventudes (NEPEJ/UNICAP), Brasil.

Albenise de Oliveira Lima albenise@unicap.br

Doutora em Saúde e Família pela Universidade de Deusto, Espanha. Professora da graduação em Psicologia da Universidade Católica de Pernambuco (UNICAP). Membro fundadora do Núcleo de Estudo e Pesquisa sobre as Juventudes (NEPEJ/UNICAP), Brasil.