Foto: Antonio Javier Caparo

O importante é alimentar a curiosidade: um ponto de partida para a divulgação da ciência junto a crianças e jovens.

Lucia Lehmann: A internet tem importância na divulgação da ciência? O que se tem feito para a divulgação científica no âmbito de sites na internet?

Neuza Rejane: A internet é um bom meio de divulgação, só que inclui muita coisa errada e não chega a atingir todos os jovens. Mas as redes sociais oferecem recursos interessantes para divulgar um tema, ou para a crítica e o questionamento. Algumas vezes,, os sites dizem coisas que, se você for pesquisar na fonte, vai ver que não são daquele jeito. O problema da internet é que existe um mundo de coisas ali e não há um controle de quem posta, o que aumenta o risco daquele conteúdo não ser correto. Então, nem sempre a primeira informação que aparece é a melhor. O site da Wikipedia tem coisas maravilhosas e outras totalmente erradas. Por outro lado, pela internet, o jovem acaba tendo hoje mais acesso à informação e, com isso, a possibilidade de ter também mais informação sobre ciência. Além de sites de universidades ou ainda outros sites mais especializados, a internet disponibiliza ferramentas, como o google maps, por exemplo, que vêm se tornando populares e que  acabam sendo um meio de divulgação também da geografia, dos lugares etc. Através da utilização dos filtros de pesquisa, do saber procurar, se consegue encontrar muita coisa na internet. No meu estudo sobre piolhos, por exemplo, consegui encontrar muitos artigos falando sobre a origem dos piolhos e condições de vida. Achei na internet dados originais e consegui informações que não encontrei nos livros, mas é preciso saber filtrar, distinguir o conhecimento.
Os que buscam informação precisam ter certo critério e cuidado na hora de coletar e interpretar os dados. É importante que, a partir do momento que o adolescente tem acesso à informação, queira ir à fonte de conhecimento original do que foi passado pela mídia ou pela internet. Muitos sites têm divulgado material valioso, como acesso a museus com imagens e  também acesso a livros gratuitos.
No caso do conhecimento científico, é importante ser crítico, ir à fonte, aos originais, a outras informações, e ver se está correto, se o texto foi traduzido corretamente. Por outro lado, os jovens buscam o que realmente lhes interessa. Os alunos buscam aquilo que gostariam de aprender na escola.

Lucia Lehmann: Você poderia nos relatar sobre suas inciativas de divulgação da ciência para crianças e/ou jovens?

Neuza Rejane: Atualmente, parte do meu trabalho tem sido transformar um saber com uma linguagem científica, artigos científicos ou publicações bem técnicas, e torná-las mais palatáveis para o grande público, mas  sem  abrir mão da qualidade. Comecei a  escrever vários artigos, vários livros, que foram publicados pela  Faperj, como o Panda gigante, trabalho que se originou de uma monografia de final de curso de uma aluna que orientei. Nós transformamos esta monografia em um livro de bolso, com o auxílio da editora da Universidade Federal Fluminense (Eduff). Este trabalho fez com que eu fosse no programa do Jô Soares falar sobre isso. Dei uma entrevista, abordando a reprodução do panda gigante. Foi uma dupla divulgação científica, o próprio livro e a entrevista, divulgando o livro, mostrando ao grande público um conhecimento da biologia do panda, sobre a preservação desse animal, tema que despertou curiosidade e interesse. É uma forma de divulgar a biologia. Daí  comecei a me interessar e efetivamente a realizar divulgação científica para um público mais amplo.
Durante 14 anos, trabalhei em uma pesquisa sobre o castrador parasitário Riggia paranensis, que é um protozoário da família do tatuí. Ele parece com um tatuí desses encontrados na areia da praia, porém fica dentro dos peixes, castrando-os, impedindo estes peixes de se reproduzirem. O protozoário cresce e impede o desenvolvimento e a reprodução do peixe. Eu desenvolvi a pesquisa, obtive resultados e publiquei através dos órgãos de fomento à pesquisa – a Fundação de Apoio à Pesquisa do Estado do Rio de Janeiro (Faperj) e o Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq). Em um determinado momento, esse estudo  finalizou para mim. Pensei então em escrever sobre os resultados que tinha obtido e também falar sobre todos os parasitas de que tinha conhecimento, mas de uma forma que fosse acessível, de modo a ser entendido pelo público em geral, pelo professor do ensino fundamental e do ensino médio. O conhecimento se organiza então numa linguagem mais palatável, sem citar todos os artigos e fontes pesquisadas, sem introduzir a cada momento no texto referências sobre aquele assunto. Esse livro foi aprovado para ser publicado pela Faperj.

Lucia Lehmann: Falar dos animais é um tema que atrai muito o interesse da  criança, do jovem também, não é?

Neuza Rejane: Sim! Quando você fala de animais, as pessoas sempre têm curiosidade. Falar de uma baleia, de um golfinho, é sempre interessante. Uma estratégia que eu utilizei também foi em um trabalho de extensão universitária falar de animais, falar da  zoologia para as crianças. Falei de baleia, de golfinho. Quando você fala de orca, vem logo aquele jargão – “orca baleia assassina!”.  Explicamos, então, que a orca não é uma baleia, é um golfinho gigante, porque tem dentes e a baleia não tem dente! A orca não é assassina porque, na verdade, ela está caçando, ela está predando como qualquer predador, para sobreviver. Assassino é uma pessoa que mata a outra por vingança ou para roubar, isso é ser  assassino, um animal não é assassino.

Neuza Rejane Wille Lima rejanewilli@uol.com.br
Doutora em Ecologia e Recursos Naturais. Professora Associada do Instituto de Biologia, Universidade Federal Fluminense, Brasil. Atua na área de Ecologia, com ênfase em Ecologia Teórica e Aplicada. É professora do curso de Pós-graduação em Ciências e Biotecnologia (PPBI) e do Curso de Mestrado Profissional de Diversidade e Inclusão desta universidade. Atua na área de divulgação científica e publicação, e também na divulgação de produtos para promover a inclusão de cegos e surdos nas áreas das ciências biológicas.
Lucia de Mello e Souza Lehmann lehmannlucia@gmail.com
Doutora em Psicologia. Professora Adjunta da Faculdade de Educação da Universidade Federal Fluminense, Brasil. Editora Associada da DESidades.