Cristiana Carneiro – Na própria lei, na legislação, quando você defende a saúde integral da criança, por exemplo, como é que você pode pensar isso disciplinarmente? Não vai conseguir, porque a criança está em um espaço, aí vem a questão da arquitetura. Ela tem uma série de questões do próprio corpo que ocupa esse espaço. Ela vai ter todas as questões da linguagem. Como pensar isso que a própria lei preconiza de uma maneira apenas disciplinar? É complicado isso.
Patrícia Corsino – Essa visão mais ampla, poder olhar o contemporâneo também, porque as crianças e os jovens são contemporâneos. Se você não tem essa visão de que eles estão situados no tempo e no espaço e carregam muitas questões do contemporâneo, que nós que somos de outra geração, muitas vezes, não conseguimos ter essa relação. Como que pesquisas podem ajudar nessa proximidade entre gerações e concepções? Se não a gente fica ali pensando a criança sob a nossa medida, sob a medida da nossa infância, e não é isso. A gente, muitas vezes, ouve palavras completamente descontextualizadas de que as crianças não têm infância, de uma visão muito autocentrada. E a importância de você ter um panorama mais amplo do contemporâneo, das crianças hoje, daquilo que elas são, podem e fazem no momento atual.
Lucia Rabello de Castro – E muito nesse sentido, né, Patrícia, ao aprofundar o conhecimento sobre infância, adolescência e juventude é inexorável que as instituições que trabalham com infância, adolescência e juventude tenham também que se transformar. Então a gente está falando da instituição escola, que tem que se transformar, da instituição judiciário, que tem que se transformar, em relação aos aspectos que lidam com infância, adolescência e juventude. A gente pode imaginar que até as instituições que nunca pensaram na infância, adolescência e juventude têm que se transformar, como, por exemplo, os partidos políticos, a própria democracia, a própria institucionalização da política, é como se a gente pudesse dizer que tem que haver uma certa “infancialização” da sociedade. Assim como o Georg Simmel4 falou da feminização da sociedade, tem que ter uma infancialização da sociedade, para que esses sujeitos possam caber e serem reconhecidos dentro de uma sociedade democrática. Uma sociedade que também acolhe esses sujeitos e não coloca eles à margem, com todas as graves consequências que isso tem.
Patrícia Corsino – Eu acho que estamos aqui falando de colocar as crianças e jovens mais no centro de uma atenção, inclusive em uma universidade. Acho que, quando a gente faz esse núcleo na universidade, a gente está dizendo para a universidade e para a sociedade como um todo que crianças e jovens existem. As crianças e jovens existem, vivem a sociedade, vivem intensamente a sociedade, mas não participam muitas vezes das decisões.
Lucia Rabello de Castro – Essa iniciativa de criação do NIAJ e do programa de mestrado é uma aposta, que é claro que nós do NIAJ estamos fazendo, mas é uma aposta que a UFRJ também tem que vir junto com a gente. A gente obteve pareceres muito favoráveis no processo, e a gente está aguardando o edital de Análise de Propostas de Cursos Novos (APCN) da Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (CAPES). Nesse sentido, a gente está se sentindo apoiada pela universidade. Eu acho que a universidade compreende a importância e a relevância desse movimento se expandir a ponto da criação de um programa na área de infância, adolescência e juventude. É um programa que a UFRJ vai liderar, mas que tem a participação conjunta também de outras universidades públicas do estado do Rio de Janeiro. Isso é muito importante, porque a gente tem um arsenal de colegas que estão pesquisando, que são uma inteligência dentro dessa área. É importante que a gente conte, porque a gente vai ter que criar redes de fortalecimento, não só de formação, mas de pesquisa, de extensão, de troca nacional e internacional. Eu acho que a ampliação para fora dos muros da própria UFRJ é importante. O NIAJ representa esse momento, um momento de verdade da infância, adolescência e juventude na UFRJ, com a instalação e institucionalização do NIAJ e desse programa.
Cristiana Carneiro – Nosso evento está chegando ao fim. Foi muito interessante e um prazer ouvir a Lucia. A gente sempre quer a escutar, não é, Lucia?! E nesse modelo de entrevista pode ser algo mais afetivo. É fundamental a gente trazer um pouco mais da trajetória e isso não ficar apenas em nossos núcleos, mas falar disso para a universidade como um todo. Queria lhe agradecer muito e agradecer à Patrícia também.
Patrícia Corsino – Eu que agradeço. É importante o resgate da história para pensar no futuro, já que a gente está aqui discutindo os futuros possíveis. Também quero parabenizar a Lucia e a Cristiana por este momento. É um momento também para apostarmos nesse futuro.
Lucia Rabello de Castro – Eu também só tenho a agradecer vocês duas, que também tiveram a ideia e fizeram todo esse movimento de a gente estar presente no Festival de Conhecimento, que é uma oportunidade valiosa de trazermos para a universidade, como um todo, essa iniciativa desse grupo fabuloso, que está completamente imbuído de uma vontade política de fazer acontecer o NIAJ e o programa de mestrado. Eu tenho certeza de que ele vai abrir comportas para o Rio de Janeiro, para o Brasil e para a América Latina em termos de trocas, diálogo, interlocução, produção de conhecimento. Eu acho que nós todos/as estamos muito esperançosos/as nesse futuro. É claro que a gente tem tido uma vida, um cotidiano muito atribulado, muito difícil, catastrófico e dramático, mas acho que temos que nos alimentar, de alguma forma, de esperança, de sonho, de utopia, de vontade de transformar essa realidade que está muito dura para a universidade. Muito difícil para as crianças, adolescentes e jovens, que são essas categorias que provavelmente sofrem mais em tempo de crise, de guerra híbrida, como estamos vivendo no Brasil, com o aumento da desigualdade, da miséria e do desemprego. Nossa vontade – eu estou aqui representando o grupo, falando do NIAJ, falando por todos nós –, é a vontade de estar aqui na universidade e de trazer essa novidade através do NIAJ e do programa de mestrado que está se consolidando e que ele abra um futuro muito possível e de muita esperança para as crianças, adolescentes e jovens.
Cristiana Carneiro – Obrigada, Lucia. Obrigada, Patrícia. Finalizo esta entrevista aqui. Muito obrigada também todos e todas que nos ouviram. Vamos projetar e concretizar esses futuros que começam com a nossa ação!
Resumo
Esta entrevista, realizada durante o Festival do Conhecimento UFRJ 2021, aborda o histórico de criação do Núcleo Interdisciplinar de Estudos da Infância, Adolescência e Juventude (NIAJ), a partir de uma modificação do Núcleo Interdisciplinar de Pesquisa e Intercâmbio para a Infância e Adolescência Contemporâneas (NIPIAC), fundado em 1998, na Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ). A entrevista destaca a importância da proposta do NIAJ para a criação de um programa de pós-graduação interdisciplinar na área da infância, adolescência e juventude, uma iniciativa inédita no Brasil, liderada pela UFRJ, com a participação conjunta de outras universidades públicas do estado do Rio de Janeiro. Foram abordados os possíveis impactos na produção de conhecimento sobre infância, adolescência e juventude no Brasil e na América Latina, a partir da institucionalização do NIAJ como um espaço de interlocução interdisciplinar e inovador.
Palavras-chave: infância, adolescência, juventude, interdisciplinaridade, universidade.
NIAJ, ¿espacio innovador para niños, niñas, adolescentes y jóvenes?
Entrevista de Cristiana Carneiro y Patrícia Corsino con Lucia Rabello de Castro.
Resumen
Esta entrevista, realizada durante el Festival do Conhecimento UFRJ 2021, aborda la historia de la creación del Núcleo Interdisciplinar de Estudos da Infância, Adolescência e Juventude (NIAJ), a partir de una modificación del Núcleo Interdisciplinar de Pesquisa e Intercâmbio para a Infância e Adolescência Contemporâneas (NIPIAC), fundado en 1998, en la Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ). La entrevista destaca la importancia de la propuesta del NIAJ para la creación de un programa de posgrado interdisciplinario en el área de la infancia, adolescencia y juventud, una iniciativa inédita en Brasil, liderada por la UFRJ, con la participación conjunta de otras universidades públicas del estado de Rio de Janeiro. Fueron abordados los posibles impactos en la producción de conocimiento sobre la infancia, adolescencia y juventud en Brasil y en Latinoamérica, a partir de la institucionalización del NIAJ como un espacio de interlocución interdisciplinario e innovador.
Palabras clave: infancia, adolescencia, juventud, interdisciplina, universidad.
NIAJ, groundbreaking space for children, adolescents and young people?
Cristiana Carneiro and Patrícia Corsino interview Lucia Rabello de Castro.
Abstract
This interview, which took place during the Festival do Conhecimento UFRJ 2021, touches upon the history of the creation of Núcleo Interdisciplinar de Estudos da Infância, Adolescência e Juventude (NIAJ), through a transformation of Núcleo Interdisciplinar de Pesquisa e Intercâmbio para a Infância e Adolescência Contemporâneas (NIPIAC), founded in 1998 in Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), Brazil. The interview highlights the importance of NIAJ’s proposal for the creation of an interdisciplinary graduate program in the field of childhood, adolescence and youth, a novel iniciative in Brazil, led by UFRJ in a joint effort with other public universities in the state of Rio de Janeiro. The possible impacts on the production of knowledge about childhood, adolescence and youth in Brazil and Latin America were discussed, considering the institutionalization of NIAJ as a novel space for interdisciplinary dialogue.
Keywords: childhood, adolescence, youth, interdisciplinarity, university.
A versão audiovisual da mesa está disponível no YouTube no seguinte endereço:
Data de recebimento: 16/07/2021
Data de aprovação: 03/11/2021