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A escola como promotora da saúde mental e do bem-estar juvenil: oficinas pedagógicas com adolescentes

Promover um diálogo entre educação e saúde é essencial no que tange ao desenvolvimento de pessoas, sobretudo das juventudes. Conforme elucidam Casemiro, Fonseca e Secco (2014), são áreas que caminham juntas, pois bons níveis de educação estão relacionados a uma sociedade mais saudável, e uma população saudável tem maiores possibilidades de se apropriar dos conhecimentos da educação formal e informal. A saúde, nesse sentido, configura-se como um importante recurso do desenvolvimento humano, pessoal e social atravessada por inúmeros fatores ambientais, biológicos, políticos e econômicos que atuam como determinantes na qualidade de vida e bem-estar dos sujeitos (Brasil, 2016a), sendo, portanto, “um conceito em construção, em movimento, dependendo de valores sociais, culturais, subjetivos e históricos” (Brasil, 2002a, p. 12).

Sendo assim, como já propunha a 8ª Conferência Nacional de Saúde (1986), importante marco histórico na promoção da saúde no Brasil, é fundamental compreendê-la sob a ótica da integralidade, de maneira a envolver e fortalecer diferentes setores, instituições, serviços e ações no cuidado e proteção à vida humana (Brasil, 2019; Carvalho, 2008). Nesse sentido, a escola, enquanto instituição educativa, configura-se como um importante espaço para a concretização de ações de saúde, uma vez que nela o adolescente passa grande parte de seu dia, troca experiências, adquire conhecimentos e constrói vínculos (Faial, L. et al., 2016). Portanto, é também responsabilidade da escola adotar práticas e iniciativas que deem oportunidade para que haja condições necessárias para a manutenção da saúde e bem-estar dos estudantes, pautada numa perspectiva de atenção integral e atendimento às necessidades dos mesmos, “numa relação dialógica do cuidar/ser cuidado, do ensinar/aprender” (Brasil, 2002a, p. 14).

O Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA), legitimado em 1990 no Brasil, foi fundamental para a garantia de proteção à vida e à saúde das crianças e adolescentes mediante a efetivação de políticas públicas que possibilitem o crescimento sadio e harmonioso deles, sendo o direito à educação primordial para o desenvolvimento pessoal e o exercício da cidadania (Brasil, 1990). Nesse sentido, a escola assume, além da sua função pedagógica, uma função que é social e política, direcionada à transformação da sociedade através da prática da cidadania, da oferta de conhecimentos e oportunidades de aprendizagem, crescimento e, portanto, do compromisso com ações que viabilizem propostas de promoção da saúde (Brasil, 2002b). Desse modo, o processo educativo deve garantir a formação do ser humano ao nível físico, intelectual e moral, sendo ator fundamental para o desenvolvimento integral dos sujeitos (Toledo, 2019). A educação, nesse viés, encontra-se atrelada à saúde na medida em que possibilita o crescimento pessoal e a interação com o outro, o que subsidia a construção de projetos, relações e ambientes mais saudáveis (Ribeiro et al., 2016).

Logo, de acordo com o Ministério da Saúde (Brasil, 2002b), promover saúde na esfera da educação formal diz respeito à integração de saberes para conscientizar e estimular a autonomia, cuidar da saúde mental e estabelecer diálogos e comunicação entre os sujeitos, objetivando envolvê-los nessa tarefa de forma compartilhada. Compreender, assim, que a educação e o conhecimento são construídos através da interação e colaboração entre os indivíduos, fruto das motivações, experiências e valores de cada um e que, portanto, promover saúde no contexto escolar “tem a ver com respeito às possibilidades e aos limites do corpo, do intelecto e das emoções, da participação social e do estabelecimento de alianças” (Brasil, 2002b, p. 535).

Dessa maneira, segundo Gomes e Horta (2010), o elo entre essas áreas somadas ao suporte familiar é fundamental para a constituição dos sujeitos e para o incentivo ao autocuidado com a saúde, além de valorizar sua participação e protagonismo nos diversos contextos em que atuam. Para tanto, é necessário reconhecer no adolescente que se encontra na escola sua subjetividade, seus diferentes modos de vida e as dimensões sociais, econômicas, familiares e afetivas que o influenciam, fazendo uso da atenção e da escuta para perceber o sentido das queixas e demandas que apresentam (Gomes; Horta, 2010).

Para além do desenvolvimento e das transformações que ocorrem a nível biológico, físico, cognitivo e emocional próprias desse período, a adolescência deve ser compreendida como uma construção social (Papalia; Feldman, 2013). Assim, as mudanças que ocorrem nesse período também perpassam os modos de agir e pensar do jovem, seu posicionamento e assunção de papéis diante dos grupos e espaços de que faz parte (Gonçalves et al., 2016). Dessa maneira, existem diferentes fatores que podem afetar a saúde dos adolescentes até a vida adulta, incluindo comportamentos de risco como uso de drogas, exposição à violência e maus-tratos, dificuldade de acesso à escola e serviços de saúde, pobreza, entre outros (Araújo et al, 2015). Segundo os autores, tais condições tornam essa faixa etária mais vulnerável nos âmbitos psíquico, biológico e social, o que exige uma atenção mais ampla e sensível voltada à saúde do adolescente. Além disso, as juventudes também expressam vulnerabilidades nas dimensões dos valores, emoções e contextos culturais, o que destaca a participação juvenil no cuidado e na cidadania como impulsionadora do desenvolvimento humano, da autonomia, da transformação social e, por consequência, do bem-estar subjetivo (Guimarães; Lima, 2011).

Nessa perspectiva, a adolescência não deve ser interpretada como um período de transição entre a infância e a vida adulta, interpelada por ambivalências, rebeldia e desafios como geralmente é caracterizada por diferentes concepções (Schoen-Ferreira; Aznar-Farias; Silvares, 2010), mas, sim, como um momento de significados e interpretações próprias de cada indivíduo em um contexto social e histórico, com marcas culturais. Nesse viés, Bock (2007) elucida que a adolescência é vista como uma construção social, com repercussões na subjetividade e no desenvolvimento dos sujeitos e que, portanto, pode assumir novas formas de interpretação na sociedade. Ser adolescente carrega, primordialmente, inúmeras possibilidades de expressão, com novas maneiras de ser e existir (Berni; Roso, 2014).

A adolescência é, nessa perspectiva, um processo que “não só sofre influências de sua cultura, mas que se constitui a partir dela” (Berni; Roso, 2014, p. 132). Assim como a adolescência, o conceito de juventude pode ser considerado bastante amplo, complexo e dinâmico, uma construção social, histórica e mutável entre culturas e gerações. Para Abramovay e Castro (2015), as experiências e vivências pertencentes ao campo das juventudes se expressam de maneira diversa e distinta, assim como apresentam diferentes representações e significados nos mais variados contextos. Constroem-se, portanto, através da produção de estereótipos, referências e marcos históricos de cada sociedade, perpassadas por questões de gênero, classe, raça, grupo, entre outras (Abramovay; Castro, 2015).

Uma dimensão importante da condição juvenil, segundo Dayrell e Carrano (2014), é a sociabilidade. Esta se desenvolve em espaços de lazer e também na escola e no trabalho, já que, através dos grupos de pares e amigos, os jovens ampliam suas referências e experiências na construção de suas identidades. A sociabilidade pode se expressar, também, em diferentes tempos e espaços intersticiais recriados de maneira a oportunizar trocas afetivas, comunicação e solidariedade em meio aos determinismos institucionais. Dessa maneira, as discussões no campo das juventudes perpassam pelo reconhecimento do processo de socialização e transmissão de valores que se estabelecem nas relações com a escola e dentro dela (Abramovay; Castro; Waiselfisz, 2015).

Sob esse viés, para Buss (2001), o ambiente em que o adolescente se desenvolve e está inserido é um dos fatores que mais influencia as condições do seu existir. Nesse sentido, é preciso pensar em ações que transformem os sujeitos, que os preparem para enfrentar as adversidades, uma educação alicerçada na saúde é parte de uma formação ampla para a cidadania e promove a articulação de saberes de maneira integral, bem como a participação de diversos indivíduos no meio social (Carvalho, 2015). Sendo assim, segundo o autor, a escola é o lugar onde a realidade deve ser questionada e refletida, e as ações que visam à saúde, quando associadas a práticas pedagógicas, podem ser o ponto de partida.

A escola é, assim, um importante ambiente de intercâmbio de ideias, troca de conhecimento, de construção pessoal e coletiva, pluralismo cultural, de encontro e crescimento. Constitui um espaço que possibilita a aprendizagem não somente no viés cognitivo e curricular, mas também na representação de “um campo de interações sociais, crescimento integral e construção cultural” (Brasil, 2015, p. 5). A instituição educativa não apenas transmite conhecimentos, nem mesmo apenas os produz, mas ela também fabrica sujeitos, produz identidades e deve estar, intrinsecamente, comprometida com a manutenção da sociedade (Louro, 2014).

Paulo Freire (1996), ao pensar sobre os desafios da educação, considera que uma das importantes tarefas da prática educativo-crítica é propiciar condições para que os sujeitos, em suas relações uns com os outros, tenham a experiência de assumirem-se como seres históricos, sociais, pensantes, criadores e ativos, agentes de transformação do seu entorno. De acordo com Gomes e Horta (2010), um ambiente educativo que promova práticas de cuidado e atenção à saúde, pautadas no respeito aos indivíduos enquanto seres humanos e na valorização de suas qualidades, favorece a assimilação e a capacidade de tomar decisões. Nesse mesmo viés, a escola representa um local promissor para a prática das ações de saúde na medida em que possibilita aos jovens a apropriação da realidade, das relações interpessoais e do próprio ambiente (Faial, L. et al., 2016). Leão, Dayrell e Reis (2011) elucidam que aos jovens devem ser proporcionados tempos, espaços e relações de qualidade que lhes possibilitem experimentar e desenvolver suas habilidades.
Por outro lado, como apontam Dayrell e Carrano (2014), nem sempre a escola dá voz ao jovem em escolhas importantes a serem tomadas acerca de questões que dizem respeito a ele e à própria instituição da qual faz parte, sendo que tal realidade desestimula a participação ativa e o protagonismo dos estudantes. Nesse sentido, cabe à escola buscar compreender a relação que o aluno estabelece com ela, o que faz sentido para ele naquele espaço e com o que se aprende para, então, sustentar suas expectativas e sonhos (Abramovay; Castro; Waiselfisz, 2015). É preciso, como propõem Dayrell e Carrano (2014), pensar de que maneira os espaços em que os jovens atuam, recriam e atribuem significados inspiram suas decisões e projetos de vida. Compreender, portanto, que estes vivenciam o tempo de maneira singular e distinta nos diferentes ambientes que ocupam, seja na escola, seja em casa ou no trabalho. Através da produção de significados e das interações afetivas e simbólicas, esses espaços passam a ter sentido, tornam-se um lugar e nele se constroem memórias individuais e coletivas, atuando como suporte para as relações sociais que se estabelecem (Dayrell; Carrano, 2014).

Segundo Weller (2014), um marco importante no processo de amadurecimento e ganho de autonomia na juventude é a elaboração de projetos de vida, momento que coincide com a vivência do Ensino Médio e ocorre de maneira dinâmica na medida em que os jovens lidam com as mudanças e situações que aparecem. Além de configurar uma etapa da escolarização, o Ensino Médio corresponde a um período em que se deposita nos jovens uma série de expectativas relacionadas à transição para a vida adulta, em termos de competências intelectuais, sociais, profissionais, dentre outras. Ademais, esse tempo é marcado por reflexões em torno da própria experiência, de um saber sobre si e da busca por sentido (Leão; Dayrell; Reis, 2011; Weller, 2014).

Assim, segundo os autores, o desafio da escola é fornecer ferramentas e informações para que os jovens que frequentam o Ensino Médio tenham a possibilidade de experimentar e traçar novos rumos diante da realidade que lhes é apresentada. É através do compartilhamento às demandas que surgem que o espaço educativo poderá contribuir para a constituição de identidades positivas e para a construção de projetos nas esferas individual e coletiva (ibidem). Portanto, como defende Pacheco (2019), é preciso se ocupar de uma educação inovadora, que procure ressignificar a relação com o saber, atribuir sentido aos espaços comuns e que estimule a autonomia e o protagonismo juvenil. E, ainda, conforme afirma Abromavay (2018), considerar a participação das juventudes como força motriz para a solidificação de uma educação que acolha de maneira ativa as diferentes formas de expressão e trajetórias individuais a fim de captar as potencialidades de cada aluno, gerando sentimentos positivos de motivação e pertencimento.

Isso posto, de acordo com o Ministério da Saúde (Brasil, 2015), uma vez que a escola assume papel fundamental nas interações sociais e no crescimento integral dos sujeitos, configura-se também como um espaço de construção da cidadania e do convívio entre os pares que, quando respeitoso, fomenta a edificação de uma cultura de paz e de prevenção às violências. A cidadania, segundo Guimarães e Lima (2011), é resultante desse processo de integração social e, nesse viés, na medida em que o jovem aprende a articular o sofrimento pessoal e as experiências sociais, constrói uma visão de mundo mais pautada na consciência crítica, o que interfere diretamente na organização e vivências da sociedade, bem como nos processos de construção de si e do outro.

A educação em saúde dentro do ambiente escolar permite aos jovens a incorporação de atitudes e comportamentos sadios em diferentes dimensões, desenvolve a noção de responsabilidade social e os capacita para a participação como sujeitos ativos e coautores em seu processo de saúde (Faial, L. et al., 2016). Desse modo, a aprendizagem contempla o desenvolvimento completo dos estudantes, incluindo competências e habilidades emocionais, como capacidade de comunicação e relacionamento, cooperação, confiança, responsabilidade, entre outros. Tal processo deve firmar-se na responsabilidade compartilhada entre os campos da educação e da saúde na proteção e promoção dos direitos humanos e no respeito indelével à diversidade de gênero, cultural, étnico-racial e religiosa. Desse modo, essa responsabilidade compartilhada é, juntamente com a família, protagonista no cuidar e no desenvolver da autoestima, criatividade e curiosidade em crianças, jovens e adultos (Brasil, 2015).

As possibilidades de construções internas e subjetivas do jovem, enquanto sujeito ativo, se dão, portanto, a partir das atividades externas, nas relações sociais e afetivas, o que ressalta a influência do entorno na esfera da saúde mental e bem-estar subjetivo dos indivíduos, nas diferentes fases do seu desenvolver. Nessa perspectiva, como ressalta a Organização Pan-Americana de Saúde (OPAS), não é possível falar em saúde mental sem reconhecer os fatores externos que a influenciam, como as mudanças sociais, condições de trabalho, estilos de vida, questões de gênero, entre outros (OPAS, 2016).

Sendo assim, saúde mental, segundo o Relatório Mundial da Saúde (OMS, 2002), é um conceito amplo que abrange o bem-estar subjetivo, a autonomia, a autoeficácia, a competência e a autorrealização do potencial intelectual e emocional dos indivíduos. É necessário, nesse sentido, um entendimento da totalidade de aspectos que afetam o desenvolvimento físico, mental e social dos sujeitos, pois, como proposto, são “fios da vida estreitamente entrelaçados e profundamente interdependentes” (OMS, 2002, p. 29). Tal temática deve, primordialmente, dialogar com os diversos fenômenos sociais nos quais os adolescentes, em seu processo de adolescer, estão inseridos; isto é, deve estar ancorada em uma perspectiva múltipla e plural (Rossi et al., 2019). Nesse mesmo viés, outras informações fornecidas pela Organização Pan-Americana da Saúde (OPAS) destacam a adolescência como um período fundamental para o desenvolvimento de hábitos significantes na manutenção do bem-estar social e emocional (OPAS, 2018).

Ademais, de acordo com a Organização Mundial de Saúde (OMS), citada pela Organização das Nações Unidas (ONU, 2018), um em cada cinco adolescentes enfrenta problemas de saúde mental e estima-se que metade das doenças mentais começa aos 14 anos de idade; porém, não recebem diagnóstico ou tratamento na maioria dos casos. A organização aponta, ainda, a depressão como uma das principais causas de adoecimento e incapacidade entre os jovens e o suicídio como sendo a segunda maior causa de morte entre pessoas de quinze a vinte e nove anos de idade (ONU, 2018). Sendo assim, a discussão em saúde mental se mostra urgente e necessária, uma vez que a não oferta de condições e serviços de saúde trazem prejuízos em todos os âmbitos da vida do adolescente, que se estendem até a vida adulta e comprometem suas possibilidades de prosperar (OPAS, 2018).

Sendo assim, o setor educacional se mostra como grande aliado na promoção da saúde através de ações que valorizem as capacidades dos sujeitos e ofereçam suporte para a tomada de decisões favoráveis à saúde individual e coletiva, direcionadas ao fortalecimento dos fatores de proteção e à construção de ambientes saudáveis para a edificação de uma nova cultura voltada para a qualidade de vida (Brasil, 2002b).

Logo, as relações interpessoais vivenciadas pelos jovens em diferentes contextos dão suporte às possibilidades de engajamento, de expressão e, por consequência, impulsiona-os para as diversas experiências da vida (Rossi et al., 2019). No entanto, de acordo com os autores, tais relações também podem ser violentas, desencadeadoras de estresse e podem contribuir com o sofrimento psíquico. A violência, segundo Witter (2010), encontra-se generalizada nas relações, instituições e na sociedade, manifestando-se em diferentes níveis e formas. Nesse sentido, embora a escola seja uma instituição que assume papel fundamental no desenvolvimento dos adolescentes, é também permeada por práticas violentas de natureza física e psicológica (Sales; Sousa, 2012). Para Alane Freire e Aires (2012), a prevenção e enfrentamento às violências nas escolas deve partir de uma compreensão ecológica do fenômeno; isto é, como sendo resultante das relações que se estabelecem entre as dimensões pessoais, sociais, familiares e educacionais em que o sujeito está inserido.

Diante disso, apoiado em uma práxis psicológica e crítica, como propõe Carneiro (2013), o trabalho interventivo deve buscar a integração dessas realidades, atuando, ainda, de maneira preventiva no enfrentamento às situações de injustiça, opressão e violência, na preservação e respeito à diversidade humana em sua complexidade. Sendo assim, para traçar possíveis soluções, é necessário, sobretudo, compreender o adolescente que se encontra na escola sob a ótica da integralidade, ou seja, reconhecendo todos os aspectos históricos, sociais, culturais e subjetivos que atravessam sua trajetória, que influenciam suas vivências e que atuam em seu bem-estar psicológico.

Assim, segundo Fabio Carvalho (2015), é importante reconhecer que os alunos, muitas vezes, expressam em seus comportamentos e hábitos suas experiências na família, na comunidade e que podem, por exemplo, reproduzir condutas violentas se assim for o ambiente em que se encontram. Portanto, através da aliança entre práticas pedagógicas e ações de saúde, a escola deve buscar refletir e questionar sobre essas realidades que se apresentam.

Na concepção de uma educação integral, a escola se configura como o espaço de encontro entre educação e saúde, um lugar privilegiado para a convivência social e para a consolidação de relações favoráveis à proteção e promoção da saúde (Brasil, 2018). Considera-se, portanto, que as experiências nos mais diversos meios repercutem no desenvolvimento da autonomia, adaptabilidade frente aos desafios, emoções e ações cotidianas dos adolescentes.

Isso posto, o cuidado em saúde mental, segundo Cardoso e Galera (2011), deve ser pensado em uma perspectiva plural, decorrente de uma intrínseca relação entre o sujeito, a família e diferentes profissionais, bem como os serviços de saúde. Esse cuidado não deve ser individualizante, mas deve procurar estabelecer diálogos com as múltiplas possibilidades de vivência da adolescência. O cuidado está diretamente relacionado à ampliação do horizonte de saberes, à mudança de comportamento e de perspectiva, ao engajamento e compartilhamento de valores, pois “cuidar de si é definir a própria existência, a sua forma de vida em um processo estruturante a constituição do sujeito” (Guimarães; Lima, 2011, p. 864).

É preciso, a partir disso, superar a percepção cultivada e sustentada socialmente de uma adolescência que se caracteriza como um período difícil, de crises e “rebeldia”, uma vez que tal visão culpabiliza o sujeito e individualiza a questão da saúde mental, desconsiderando a influência e a responsabilidade do contexto sócio-histórico e aumentando, ainda mais, o sofrimento psíquico das juventudes (Rossi et al., 2019). Assim, o cuidado deve ser considerado como um processo que se constrói a partir das especificidades culturais, sociais, pessoais e emocionais, atento às demandas particulares de cada pessoa ou grupo. O cuidado, além disso, deve almejar, sobretudo, o destaque às potencialidades do indivíduo, de maneira a desenvolver sua autonomia frente aos dilemas que se apresentam (Cardoso; Galera, 2011).

Conforme salientam os autores, destaca-se o valor das relações interpessoais na construção das identidades juvenis, no suporte e estímulo para as vivências e expressões do ser, além de espaços que possibilitem dar voz aos adolescentes, a fim de compreender, sob a perspectiva deles, as questões que perpassam essa etapa de suas vidas. É essencial, portanto, investigar e refletir sobre quais fatores produzem sofrimento psíquico nos jovens na atualidade, quais vivências despertam angústia e emoções negativas neles, quais são as realidades que sustentam suas narrativas e como eles podem adquirir repertório para o enfrentamento de tais adversidades (Rossi et al., 2019). A educação em saúde, nesse sentido, revela-se como campo de orientação e construção coletiva de alternativas que permitam melhor compreender a relação saúde-doença-cuidado na busca pela concretização de hábitos de vida mais saudáveis, através da interlocução entre os saberes dos profissionais da saúde, os da educação e os advindos das vivências singulares dos sujeitos (Carvalho, 2015).

À vista disso, evidenciam-se a importância e a necessidade de promover espaços de escuta atenta nos quais os adolescentes se sintam acolhidos para falar, refletir e pensar sobre suas experiências e angústias, podendo manifestar, assim, sentimentos de pertencimento, segurança, confiança e apoio para o enfrentamento dos desafios (Rossi et al., 2019). Nesse sentido, a escola se apresenta como um lugar de possibilidades para o desenvolvimento de ações e atividades que contribuam com a responsabilização e o envolvimento das juventudes no cuidado com sua saúde e bem-estar (Gomes; Horta, 2010). Assim, considerar a saúde em seus múltiplos aspectos e mobilizar projetos e debates que coloquem em pauta as questões que permeiam as realidades dos alunos e da comunidade escolar são recursos que favorecem o compartilhamento de saberes e valores como cooperação e solidariedade, transformando o espaço educativo em um lugar de promoção à saúde (Brasil, 2002b).

Promover saúde é tocar nas diferentes dimensões humanas, é considerar a afetividade, a amorosidade e a capacidade criadora e a busca da felicidade como igualmente relevantes e como indissociáveis das demais dimensões (Brasil, 2002b, p. 535).

Sendo assim, acolher e legitimar as necessidades dos sujeitos e oferecer apoio nos mais diferentes contextos em que estão presentes são práticas que promovem a saúde mental e dão suporte para a construção de projetos individuais e coletivos, além de estimular a autonomia e o protagonismo nas relações e experiências cotidianas. Diante do exposto, o projeto relatado neste artigo teve como objetivo construir esse espaço de participação e cuidado para compreender como os jovens planejam seus projetos de vida na atualidade, além de favorecer o compartilhamento das questões que permeiam seu entorno. O trabalho foi desenvolvido por meio de grupos de oficinas de vertente pedagógica e psicológica, através de dinâmicas de grupo, rodas de conversa, entre outros recursos.

Sonia Maria Ferreira Koehler soniakoehler@hotmail.com

Centro Terapêutico/Guaratinguetá-SP, Brasl. Professora Titular Aposentada do Centro Universitário Salesiano de São Paulo (UNISAL) - Campus Lorena, Brasil. Psicóloga e Pedagoga. Doutorado em Psicologia Escolar e do Desenvolvimento Humano. IPUSP, Brasil (2003). Mestre em Psicologia da Educação. PUCSP, Brasil (1995).

Nathália Garcia Panacioni Gonzales nathaliaggonzales@hotmail.com

Centro Universitário Salesiano de São Paulo (UNISAL-Lorena), Brasil. Terceiranista do Curso de Formação em Psicologia - Bacharelado e Licenciatura. Bolsista BEXT-SAL, Programa de Bolsas de Extensão (BEXT-SAL 2019-2020). Integrante do Grupo de Estudos do Observatório de Violências nas Escolas, SP, Brasil.

Júlia Barbeito Marpica juliabarbeitomarpica@hotmail.com

Centro Universitário Salesiano de São Paulo (UNISAL-Lorena), Brasil. Terceiranista do Curso de Formação em Psicologia - Bacharelado e Licenciatura. Bolsista BEXT-SAL. Programa de Bolsas de Extensão (BEXT-SAL 2019-2020). Integrante do Grupo de Estudos do Observatório de Violências nas Escolas, SP, Brasil.