Foto: Antonio Javier Caparo

O importante é alimentar a curiosidade: um ponto de partida para a divulgação da ciência junto a crianças e jovens.

Entrevista de Lucia de Mello e Souza Lehmann com Neuza Rejane Wille Lima

Lucia Lehmann: No momento atual, as agências de fomento têm formulado políticas para incentivar que o conhecimento científico produzido nas universidades e centros de pesquisa possa alcançar os setores mais amplos da sociedade. Neste sentido, tem se dado atenção ao processo de divulgação científica, que nem sempre é fácil ou imediato. Estamos iniciando um movimento em que a divulgação da ciência ganha um destaque maior nos programas e metas do desenvolvimento da ciência e tecnologia e, para nós, é importante avaliar estes movimentos tendo em vista as crianças e jovens. Como você avalia esta questão ao longo dos últimos anos?

Neuza Rejane: Acho que, nos últimos anos, tem havido uma maior divulgação para o público em geral. Contudo, podemos dizer que, historicamente, a divulgação da ciência existe desde sempre. Os desenhos de Leonardo da Vinci, por exemplo, são divulgação de ciência. No Brasil, a chegada da Família Real, trouxe um interesse pelo conhecimento e os próprios jornais publicavam informações para um público de europeus que vinham para o Brasil e para os poucos brasileiros que tinham a oportunidade de estudar. Assim já se criava aqui uma forma de divulgação de ciência.
Muito mais recentemente, os Estados Unidos foram um dos primeiros países que começaram a discutir a questão da divulgação científica nas escolas, incentivando as pesquisas no país. No Brasil atual, a divulgação científica atinge jovens e crianças, mas ainda de uma forma incipiente.

Lucia Lehmann: Quais têm sido as principais iniciativas para a divulgação da ciência para crianças e jovens?

Neuza Rejane: A mídia tem contribuído com uma parcela significativa para esta divulgação. A revista Ciência hoje, que foi criada nos anos 1980, deu origem posteriormente à revista Ciência hoje das crianças; o jornal O Globo criou uma seção para crianças, o Globinho. Outras revistas, como a Superinteressante, Galileu, National Geographic, Seleções, do Reader´s Digest, já existem há muitos anos, são apropriadas tanto para o adulto quanto para o jovem. Existem ainda outras iniciativas que tiveram início há anos e que vêm sofrendo transformações, como a Scientific American, que nos anos 80 não existia no Brasil, e começou a sair primeiro em espanhol e atualmente existe a versão em português, a Scientific American Brasil. São revistas que buscam fazer divulgação científica e atingem também os jovens que têm acesso às mesmas e se interessam por ler.
Por outro lado, existem notícias divulgadas pelas mídias, jornais, rádios, televisão, dirigidas tanto ao público geral quanto aos jovens, que informam muitas coisas errôneas. Pecam, às vezes, pelo sensacionalismo. Temos que ter um olhar crítico sobre as informações e nem sempre isto é possivel, seja para o público geral, seja para os jovens ou mesmo pessoas que têm informação, mas que não conhecem aquele conteúdo ou não sabem ver incoerências naquela matéria. Algumas notícias são muitas vezes exageradas ou muito generalizadas de forma que não chegam a trazer um efetivo conhecimento. Mas não quero dizer que tudo está errado, não! O próprio professor, que busca se utilizar destas informações, precisa ter cuidado na hora de usar algumas revistas. Ele tem que ler antes, pesquisar e procurar as informações fidedignas, buscar as fontes primárias. Assim como nós, professores universitários e pesquisadores, fazemos com os artigos científicos publicados em revistas especializadas, temos que avaliar o que estamos lendo, saber as fontes….

Lucia Lehmann: Quais têm sido, a seu ver, as principais dificuldades para que se possam consolidar iniciativas voltadas para o público infantil e juvenil e promover uma efetiva difusão e divulgação da ciência?

Neuza Rejane: Uma das maiores dificuldades é atingir públicos mais específicos, como os próprios jovens, devido a eles não terem acesso, por exemplo, a algumas das revistas citadas. Elas estão disponíveis em vários lugares, até em muitas bancas de jornal, mas, mesmo assim, ainda é dificil que qualquer um possa comprá-las. Há também outros que podem ter acesso, mas não se interessam em lê-las. As escolas tinham que ter acesso a revistas de divulgação., Em geral, as aulas de ciências ainda são expositivas e depois, quando isso é possível, o professor vai para o laboratório e faz umas experiências. O professor não universitário dificilmente busca um artigo científico, isso não faz parte da sua prática. Muitas vezes, também, a divulgação científica não atinge as pessoas porque elas ainda não possuem a cultura de fazer tais leituras. Em resumo, é preciso estimular, facilitando o acesso.

Neuza Rejane Wille Lima rejanewilli@uol.com.br
Doutora em Ecologia e Recursos Naturais. Professora Associada do Instituto de Biologia, Universidade Federal Fluminense, Brasil. Atua na área de Ecologia, com ênfase em Ecologia Teórica e Aplicada. É professora do curso de Pós-graduação em Ciências e Biotecnologia (PPBI) e do Curso de Mestrado Profissional de Diversidade e Inclusão desta universidade. Atua na área de divulgação científica e publicação, e também na divulgação de produtos para promover a inclusão de cegos e surdos nas áreas das ciências biológicas.
Lucia de Mello e Souza Lehmann lehmannlucia@gmail.com
Doutora em Psicologia. Professora Adjunta da Faculdade de Educação da Universidade Federal Fluminense, Brasil. Editora Associada da DESidades.