Introdução
As relações intergeracionais no contexto organizacional são um ponto de convergência chave de diferentes questões sociais: dinâmicas sociodemográficas, estudos de gerações e relações intergeracionais, pesquisas sobre juventude e experiências em desenvolvimento organizacional.
O presente estudo foi motivado principalmente pela experiência prática desenvolvida em uma organização de trabalho cubana. Com o objetivo de entender melhor o que acontece lá e aprender com essa experiência, decidiu-se sistematizá-la, utilizando a proposta de Oscar Jara (1994). O artigo apresentado a seguir se estrutura segundo a dita lógica, o que, julga-se, é uma proposta para pesquisar de forma diferente, reconhecendo o caráter processual dos fenômenos sociais e a necessidade de examinar as nossas práticas, a fim de extrair delas lições que nos permitam refletir sobre nós mesmos, nosso ambiente e traçar metas para o futuro.
Sistematizar uma experiência é interpretá-la criticamente, com base na sua ordenação e reconstrução, descobrindo a lógica do processo vivido, os fatores que intervieram nesse processo, a relação entre eles e as causas dessa relação (Jara, 1994). Finalmente, a última etapa de um processo de sistematização é o desenvolvimento de um produto para comunicar as aprendizagens. Este artigo, embora seja sintético, é uma maneira de confessar o que aprendi.
Ponto de partida e questões iniciais
Uma organização de trabalho, pertencente ao campo da ciência, solicita à nossa equipe de pesquisa um estudo do ambiente de trabalho. Este estudo exploratório permitiu-nos perceber que o tema das relações entre as gerações era uma das principais questões controversas e geradoras de desconforto para os/as trabalhadores/as e/ou diretores/as, principalmente entre as gerações extremas: adultos mais velhos e jovens.
O problema das relações intergeracionais encontrado especificamente nesta organização é uma expressão em pequena escala de fenômenos sociais que dizem respeito a um contexto mais amplo. A tendência cubana ao envelhecimento da população faz com que, muitas vezes, várias gerações coabitem no mesmo espaço social, seja familiar, comunitário ou em qualquer outra instituição da sociedade. Assim, o estudo deste tema torna-se uma necessidade social, já que tendem a existir polaridades entre o posicionamento tradicional dos idosos e as necessidades de participação e de inovação da geração mais jovem (D Angelo et al., 2009).
Esta sistematização abre caminho ao estudo mais aprofundado deste tema na sociedade cubana, enquanto visa a promover uma reflexão crítica sobre o tema e a construir possíveis ações a serem implementadas nesta organização, a partir das próprias experiências dos/as trabalhadores/as sobre o seu ambiente de trabalho. Levando em conta tal meta, o objeto para sistematizar serão as “experiências de trabalho numa organização cubana, no campo da ciência, em que foi realizado um estudo de ambiente de trabalho”. Assim, o foco principal é sistematizar as características das relações intergeracionais neste contexto organizacional, principalmente entre as gerações extremas: mais velhos e adultos jovens. Este será o fio condutor em que se concentrarão as atenções.
Recuperação do processo vivido: um estudo de caso sobre relações intergeracionais no contexto organizacional cubano
A experiência que será descrita teve lugar numa organização de trabalho cubana, em Havana, dedicada ao desenvolvimento da atividade científica e à realização de serviços técnicos. A direção desta organização solicitou um estudo de ambiente de trabalho devido a preocupações com a flutuação da sua equipe, especialmente os/as jovens.
Diferentes técnicas e métodos foram aplicados, o que permitiu triangular informações e complementar os resultados. Eles foram aplicados na seguinte ordem:
1. Análise documental: documentos específicos da organização foram analisados com o objetivo de obter informações sobre sua missão, visão, valores declarados, objetivos organizacionais, estrutura e funções, estado e características sociodemográficas da força de trabalho, entre outros aspectos.
2. Questionário de clima laboral: foi utilizado um questionário com perguntas fechadas, com uma escala de classificação que mostra a tendência do clima organizacional, e perguntas semiestruturadas, que permitem explorar o saber e sentimentos dos membros da organização, a partir de uma interpretação qualitativa.
3. Entrevistas em profundidade: diversas áreas foram levadas em conta, assim como idade, gênero e nível profissional dos participantes na pesquisa. As entrevistas permitiram pesquisar a percepção de diretores/as e trabalhadores/as sobre as diferentes variáveis relevantes para o diagnóstico, com o objetivo de ampliar, complementar e aprofundar as informações obtidas na pesquisa.
4. Sessão de trabalho grupal com membros da organização para confirmar e ampliar os resultados e criar estratégias possíveis ou soluções de melhoria. Finalmente, os resultados foram apresentados e discutidos numa sessão de devolutiva com a direção do centro.
Os resultados mostram que existe coincidência em relação à percepção de quais são os grupos geracionais que convivem nessa organização. Três grupos foram identificados: pessoas entre 18 e 35 anos, entre 36 e 59 anos e mais de 60 anos1. Os grupos mais representativos das relações intergeracionais foram os grupos extremos (de 18 a 35 anos e de mais de 60 anos). As pessoas identificam facilmente que pertencem a um desses grupos e as características associadas a cada um deles.
A respeito das relações intergeracionais neste contexto de trabalho, foram solicitadas informações, tendo em conta os seguintes aspectos: percepção que os grupos geracionais têm sobre si mesmos e sobre os outros, identificação de temas de conflito entre gerações e identificação de outros aspectos a considerar para entender o tema estudado.