Niñas y niños en la migración de Estados Unidos a México: la generación 0.5, por Silvia Elena Giorguli Saucedo e Víctor Zúñiga.

Resenha por Mónica Jacobo-Suarez

Contra o nacionalismo metodológico: as contribuições da geração 0.5 ao estudo das crianças migrantes no corredor México-Estados Unidos.

O objetivo explícito desta obra é analisar as trajetórias migratórias dos menores de idade (0 a 17 anos) que têm chegado ao México procedentes dos Estados Unidos desde o ano 2000, referidos aqui como a geração 0.5. Ao longo de nove capítulos, os autores examinam, utilizando diferentes níveis de análise, uma pergunta: por que essas crianças estão no México, um país historicamente emigrante? Para construir as respostas, Zúñiga e Giorguli realizam um percurso demográfico dos fluxos migratórios e geográficos das crianças migrantes, examinam a escola como uma instituição mediadora da sua integração sociocultural e linguística, discutem o papel da separação familiar e da migração internacional na formação de identidades culturais dos menores. Esta é uma obra interdisciplinar que utiliza a sociologia da migração, a educação, a demografia, a linguística e a história.

Na minha perspectiva, a principal contribuição desta obra é teórica e metodológica, além dos achados empíricos que apresenta: a proposta do conceito geração 0.5 e a criação de uma tipologia e eixos analíticos para desagregar a diversidade de experiências incluídas neste conceito. Para dimensionar essa contribuição, é indispensável situar o livro no seu contexto. O conceito geração 0.5 é cunhado por Zúñiga e Giorguli depois de quase duas décadas de pesquisas sobre crianças e adolescentes no trajeto migratório México-Estados Unidos, campo no qual Zúñiga é pioneiro. Na literatura, têm se utilizado múltiplas etiquetas para se referir a essa população. Estudantes transnacionais, sojourners, menores México-americanos e migrantes retornados são somente alguns dos termos referidos nas pesquisas que abordam as experiências dos menores migrantes quando se encontram no México. Quando o que se estuda é a etapa da sua trajetória migratória que se desenvolve nos Estados Unidos, encontramos termos que fazem alusão à idade da chegada dos menores neste país, por exemplo, geração 1.25 e geração 1.5 – ou ao local de nascimento, neste caso, segunda geração versus gerações menores.

Zúñiga e Giorguli são enfáticos ao rejeitar esses termos: “segunda geração ou geração 1.5 já não fazem sentido quando essas crianças migrantes internacionais chegam ao México” (p. 21). Referir-se a esses menores como geração 1.5, uma vez no México, é incorreto porque retornam ao país onde nasceram. De qualquer jeito, os filhos de imigrantes mexicanos nascidos nos Estados Unidos são migrantes internacionais no México e não mais membros da segunda geração.

Assim, os autores propõem usar geração 0.5 como um termo que abarca a mobilidade internacional dessas crianças e seu pertencimento a uma geração de migrantes. Como pano de fundo, há uma crítica direta à pesquisa sobre menores migrantes nos Estados Unidos realizada até agora: a literatura sobre migração internacional assume que a chegada dos menores migrantes na “América” constitui o ponto final do seu itinerário migratório. Em outras palavras, é ignorada a mobilidade transnacional a qual muitos destes menores incorrem durante sua infância e adolescência. Em consequência, se estuda a integração dos menores à sociedade americana: quão bem e rápido aprendem inglês e como é sua mobilidade social, uma vez adultos. No entanto, o estudo dos menores desaparece uma vez que saem das fronteiras nacionais do país de acolhimento. Zúñiga e Giorguli chamam esse viés na literatura sobre migração internacional de nacionalismo metodológico.

Como categoria analítica, a geração 0.5 contém duas dimensões. Primeiro, o “zero” indica que, ao chegar ao México, essas crianças se colocam num novo ponto de partida. Quer dizer, o “zero” faz desaparecer a diferença entre o menor imigrante (nascido nos EUA) e o menor migrante (nascido no México) para incluir ambos numa mesma categoria analítica: a de menores transeuntes entre México e Estados Unidos. O .5, por sua vez, evoca um estado embrionário, algo que está em gestação e do qual ainda se desconhece o devir. Quais são as vantagens analíticas da geração 0.5? Primeiro, agrupar numa categoria só os diversos grupos de crianças migrantes de origem mexicana: os nascidos nos Estados Unidos e os que migram ao país dos pais como adolescentes, os nascidos no México que migraram muito novos e retornaram depois ao México, os que migraram múltiplas vezes entre ambos os países, os que nasceram nos Estados Unidos, mas que têm vivido a maior parte da sua vida no México. A segunda contribuição é abranger a diversidade de experiências migratórias mediante a criação de uma tipologia de crianças migrantes (seis tipos) e de vários eixos analíticos para este fim: país de nascimento, nacionalidade, experiência escolar e deslocamento espacial.

A respeito da abordagem metodológica, a obra utiliza distintos níveis de análise e fontes de informação. No nível macro, usa os censos e pesquisas intercensitárias do México para estimar os fluxos de retorno nas duas últimas décadas. No nível meso, se serve de pesquisas para visibilizar as experiências dos menores migrantes dentro das escolas e, a partir destas, construir a tipologia das crianças da geração 0.5. No nível micro, utiliza entrevistas mais profundas com menores e professores para construir narrativas detalhadas sobre as dinâmicas escolares, a respeito da fragmentação familiar e referente ao surgimento de identidades nacionais e étnicas entre os menores entrevistados. Sem menosprezar a complementariedade de métodos e níveis analíticos, a contribuição metodológica mais útil, ao meu parecer, é apresentar a perspectiva das crianças ao longo do livro. Diferentemente dos estudos tradicionais que abordam a migração internacional a partir de uma visão adultocêntrica, este trabalho privilegia entender e comunicar como é que os menores experimentam a migração.

É precisamente a perspectiva dos menores que permite contrastar as percepções sobre o fenômeno migratório dos adultos – como pais e professores – com as da geração 0.5. Citando um exemplo específico, enquanto os professores entrevistados por Zúñiga e Giorguli etiquetam os menores migrantes como atrasados educativamente, sem domínio do espanhol e com pouco apego à pátria, as vozes dos menores refletem o domínio de um currículo educativo, mas não o mexicano, mostrando uma grande diversidade de níveis de bilinguismo e variados níveis de biculturalidade.

Os achados deste livro permitem concluir que a geração 0.5 é uma população móvel que, com frequência, migra internamente tanto nos Estados Unidos como no México, cujas experiências e necessidades são muito diversas. Quais são as implicações e responsabilidades derivadas desta mobilidade para ambos os países? É um tema que discutem só parcialmente os autores, ao assinalar as limitações na provisão de serviços para esta população por parte do governo mexicano. No entanto, a ausência de uma discussão compreensiva das responsabilidades dos Estados Unidos e do México para com esses menores compartilhados é um ponto fraco da obra. Dada a variedade de experiências mostradas neste livro, pareceria evidente que as necessidades de integração ou reintegração dependeriam das especificidades de onde se viveu e onde se vive atualmente, assim como da situação familiar específica. Nem todos os jovens precisam do mesmo apoio, mas importa prover um mínimo de condições a partir das quais se possa trabalhar e fazer políticas apropriadas em ambos os lados da fronteira.

Por exemplo, que tipo de programas culturais e linguísticos poderiam implementar os sistemas educativos de ambos os países para facilitar a transição entre eles? Qual deveria ser o papel dos consulados e embaixadas do México nos Estados Unidos para atender às necessidades, de todo tipo, associadas à mobilidade dos menores migrantes? E, por sua vez, qual seria a responsabilidade do governo estadunidense, representado por sua embaixada no México, para garantir os direitos cidadãos dos menores nascidos nos Estados Unidos? Associado à crítica ao nacionalismo metodológico que fazem os autores, qual é a responsabilidade da academia nos Estados Unidos e no México para construir pesquisas colaborativas que permitam conectar o estudo da experiência migratória nos Estados Unidos àquela no México? Esta não é uma pergunta irrelevante, dado que os itinerários da geração 0.5 mostram que o “retorno” ao México também não é o ponto final na trajetória migratória; muitos deles pretendem retornar aos Estados Unidos no futuro.

Sem dúvida, o conceito de geração 0.5 não está isento de críticas, em particular, a partir da disciplina da demografia, em que sua utilização pode conduzir a imprecisões importantes ao incluir em uma mesma categoria analítica os menores nascidos no México e migrantes internacionais nascidos nos Estados Unidos. Essa obra também não será ignorada pelos que estudam as diversas gerações de migrantes nos Estados Unidos. E talvez seja esta crítica uma base sólida para fomentar o diálogo e colaboração tão necessários entre academias regidas por nacionalismos metodológicos.

Referências bibliográficas

ZÚÑIGA, V.; GIORGULI, S. Niñas y niños en la migración de Estados Unidos a México: la generación 0.5. México: El Colegio de México, 2019.
Palavras-chave: crianças transnacionais, geração 0.5, migração México-Estados Unidos, educação, integração.

Data de recebimento : 05/01/2020
Data de aprovação : 05/02/2020

Mónica Jacobo-Suárez monica.jacobosuarez@gmail.com
Doutora em Política Pública e Desenvolvimento Internacional, University of Pittsburgh, Pensilvania, Estados Unidos. É professora pesquisadora com dedicação integral no Centro de Investigación y Docencia Económicas, Ciudad de México, México. Suas pesquisas incluem a migração de retorno, políticas de integração para migrantes e a educação.