Foto: Gustavo e Otávio Pandolfo - OSGEMEOS

Produção sobre adolescência/juventude na pós-graduação da Psicologia brasileira

Discussão dos dados

 

O ponto de partida para a análise dos dados foi o preenchimento do roteiro de leitura, que abarcava dados gerais (Título, Autor, Nível, Tema, Instituição, Área de concentração, Orientador, Ano da defesa e Palavras-Chave), objetivos e metodologia. Após esta etapa, realizamos leitura exaustiva dos resumos e análise das palavras-chave para agruparmos as teses/dissertações por temas. Todavia, nem todos os resumos permitiam a identificação dos itens do roteiro, o que nos levou, então, ao texto integral das teses/dissertações, para localizá-los. O somatório da leitura dos resumos, de algumas teses/dissertações, palavras-chave e a utilização da frequência simples nos nortearam para a criação das categorias, realizadas através de palavras-chave e objetos mais recorrentes.

 

Alguns dos trabalhos poderiam ser encaixados em mais de um tema e, por isso, tivemos que fazer uma opção, considerando aqueles que acreditamos estabelecer maior relação com o trabalho ou em que havia maior preponderância. Certos temas pensados inicialmente tiveram um número pequeno de trabalhos e, assim, decidimos reagrupá-los em outros. Esta decisão deveu-se à intenção de não termos um largo espectro de categorias. Elaboramos uma lista de categorias temáticas e, ao fazermos leitura de cada um deles, construímos subtemas, que também se compuseram a partir de frequência simples. Essa subdivisão intencionava conhecer as especificidades possíveis nos temas e traçar um panorama.

 

A tabela abaixo ilustra, por tema, o número de teses/dissertações que estão contemplados na discussão abaixo:

 

Tabela 2 – Número de teses/dissertações por temas

  1. Violência

 

Pesquisas que discutem a violência em várias vertentes. O subtema preponderante foi Ato Infracional. Aqui se concentram teses/dissertações que pesquisaram adolescentes/jovens autores de ato infracional, nomeados em vários trabalhos como em conflito com a lei ou delinquentes. Buscou-se compreender a representação e o significado dos atos infracionais, os discursos produzidos pelos autores dos atos, a relação destes com a história de vida dos adolescentes/jovens, sua família e escola. Outro subtema recorrente, intimamente ligado a este, foi Medidas Socioeducativas, com teses/dissertações que se preocuparam mais especificamente com as medidas socioeducativas, seu cumprimento e a relação dos adolescentes/jovens com estas. A medida mais estudada foi privação de liberdade. Violência Doméstica, bastante presente, reuniu pesquisas sobre a violência cometida no âmbito doméstico e familiar, em sua maioria, com os adolescentes/jovens como vítimas. Também significativo foi o número de trabalhos em Violência Sexual, agrupando teses/dissertações sobre violência sexual cometida contra adolescentes/jovens, especialmente a intrafamiliar. Dois trabalhos investigaram os autores desta violência, uma delas tendo o adolescente como autor. Escola incorporou teses/dissertações sobre violência cometida no ambiente escolar, especialmente bullying. Violência Urbana concentra trabalhos que investigaram a violência no cotidiano, seja causada pelo trânsito ou pela transgressão dos adolescentes/jovens, a forma como a família lida com ela, a vulnerabilidade de adolescentes/jovens frente a ela. Exploração Sexual agrupa pesquisas sobre práticas e discursos de prostituição entre adolescentes/jovens. Em Fatores de Risco e Proteção estão teses/dissertações que pesquisaram estes fatores envolvidos na violência vivida por adolescentes/jovens e/ou suas famílias. As pesquisas que investigaram a constituição subjetiva a partir da violência e as formas como adolescentes/jovens lidam psiquicamente com situações violentas estão em Subjetividade. Representação da Violência contém teses/dissertações que discutiram como adolescentes/jovens percebem a violência. As pesquisas que focaram nos profissionais que trabalham com situações de violência foram agrupadas em Profissionais.

 

  1. Família

 

São trabalhos estudando relações familiares, maternidade, paternidade, práticas educativas parentais e relações intergeracionais. Relações Familiares foi a subcategoria mais presente, com trabalhos que discutem relações familiares como um todo; entre membros; a partir de uma situação específica na família, como uma patologia, um ato infracional, uso e abuso de drogas; estilos parentais na educação e relação com os filhos. Em segundo lugar, presentes igualmente, estão os subtemas: Paternidade, que congrega teses/dissertações investigando como adolescentes/jovens vivenciam a paternidade; e Práticas Educativas, que examinaram como pais e/ou mães lidam com comportamentos de risco de seus filhos e com a imposição de limites. Em terceiro lugar, estão Políticas Públicas e Sociais (trabalhos que pesquisaram a relação da família com abrigamento e institucionalização, a rede de garantia de direitos e projetos sociais) e Maternidade (pesquisas sobre a maternidade vivida por adolescentes/jovens). Fraternidade agrupou teses/dissertações que discutiram as relações fraternais. Os trabalhos que investigaram relações intergeracionais, especialmente entre adolescentes/jovens e seus avós, foram agrupados em Geração. Temos ainda Adoção (experiência de adolescentes/jovens adotados); Recasamento (modo como adolescentes/jovens experienciam o recasamento de seus pais); Divórcio (sobre a experiência do divórcio dos pais para adolescentes/jovens), Gravidez (vivência desta por adolescentes/jovens); e, Sexualidade (forma como pais lidam com a sexualidade de seus filhos).

 

  1. Subjetividade

 

Trabalhos abrangendo discussões sobre características psicológicas, identidade, relações interpessoais, sentimentos, produção de subjetividade, valores e processos psíquicos. O subtema com maior número foi Identidade, com pesquisas sobre os processos de construção, mudanças e percepções da identidade, considerando também identidade de gênero e raça/etnia. Houve um número expressivo de pesquisas em Moralidade, com teses/dissertações que trabalharam questões como honra, responsabilidade, juízo e julgamento moral. Outros subtemas foram: Tempo, onde se pesquisa a forma como adolescentes/jovens lidam com o tempo; Construção de Sentidos, que investiga como adolescentes/jovens constroem os sentidos da vida; Vulnerabilidade, trabalhos sobre adolescentes/jovens em situação de vulnerabilidade, suas condições de vida e estratégias para lidar com a situação; Contemporaneidade, teses/dissertações sobre como aspectos considerados próprios da contemporaneidade atingem os adolescentes/jovens; Ambiente, pesquisas que discutem a relação dos adolescentes/jovens com sua cidade; Conflitos, estudos que analisam resolução de conflitos por adolescentes/jovens; Habilidades sociais, com trabalhos sobre como os adolescentes/jovens lidam com elas.

 

  1. Políticas públicas e sociais

 

Sob o título se encontram dissertações/teses que investigam Conselhos Tutelares, políticas de abrigamento, adolescentes/jovens em situação de rua, redes de atendimento para este público, medidas socioeducativas, políticas governamentais e organizações não governamentais. Nesta categoria, houve um grande número de teses/dissertações que tratam de questões trazidas pelo ECA. O subtema com maior número de trabalhos foi Abrigamento, que agrupou aqueles que discutem esta medida a partir da reinserção, desligamento, relação com a família, profissionais e adolescentes/jovens envolvidos. Em segundo, temos Medidas Socioeducativas, que engloba as teses/dissertações que discutem estas medidas e adolescentes/jovens, profissionais e trabalho da Psicologia incluídos. Outros subtemas relacionados com o ECA são Conselho Tutelar, com trabalhos que analisam a prática dos Conselhos; Conflito com a lei, pesquisando adolescentes/jovens em conflito com lei e práticas concernentes a eles; ECA, que estudou o Estatuto. Situação de Rua teve o terceiro maior número de teses/dissertações, que investigaram adolescentes/jovens nesta situação, assim como profissionais envolvidos no seu atendimento. Em Projetos estão as teses/dissertações que pesquisaram projetos ou programas de atendimento a adolescentes/jovens. Outros subtemas foram: Cotas raciais, com o debate sobre a representação dos adolescentes/jovens da política de cotas raciais; Redes Sociais, que pesquisaram redes de atendimento a adolescentes/jovens; Práticas de institucionalização, que buscaram refletir sobre estas práticas junto a adolescentes/jovens; e Protagonismo, que investigam o protagonismo entre os adolescentes/jovens.

 

  1. Desenvolvimento

 

Aqui se reúnem pesquisas que focam na discussão sobre processos psicossociais relacionados à adolescência/juventude, funcionamento cognitivo, moralidade, transformações psíquicas e sociais consideradas como próprias desta etapa. Dois subtemas foram os mais recorrentes: Concepção de Adolescência e Desenvolvimento Moral. O primeiro agrupou teses/dissertações que tratam do entendimento sobre o processo da adolescência, especialmente em seus aspectos psíquicos, por parte de profissionais, familiares e do próprio adolescente/jovem. O segundo subtema se refere à constituição da moral. Um terceiro subtema significativo foi Identidade, em que se discutem as transformações da identidade e sua constituição nessa fase. Subjetividade reuniu trabalhos investigando características psíquicas dos adolescentes/jovens, tais como traços de personalidade, cognição e ludicidade, envolvidas no desenvolvimento. Há ainda Família, que congregou pesquisas discutindo as relações familiares no processo de adolescer.

 

  1. Clínica

 

Teses/dissertações que estudam a clínica psicológica, em várias áreas e perspectivas teóricas, junto ao público adolescente/jovem, buscando entender aspectos específicos a este público ou discutindo a especificidade da clínica junto a este público. O subtema mais recorrente foi Prática Profissional, que agrega os trabalhos que debatem formas de aplicação da Psicologia na clínica, investigando especificidades da prática, propondo modelos de atuação clínica ou pesquisando conceitos para a prática. Outro subtema bastante presente foi Orientação Profissional, que investigou esta prática de trabalho na Psicologia. Um subtema afim a este é Escolha Profissional, que teve a particularidade de agrupar pesquisas que focaram nos adolescentes/jovens lidando com a escolha profissional. Práticas Clínicas englobou teses/dissertações que trataram da clínica na perspectiva de profissionais que atendem adolescentes/jovens.

 

  1. Psicopatologia

 

Trabalhos que objetivam a discussão sobre saúde mental e patologias psíquicas que acometem adolescentes/jovens. O subtema com maior número de trabalhos foi Doença Mental, que agrupou pesquisas que investigaram patologias psíquicas em várias dimensões. O segundo subtema preponderante foi Transtorno Alimentar, com teses/dissertações sobre a vivência deste transtorno entre adolescentes/jovens. O terceiro subtema foi Ato, com investigações sobre atos realizados por adolescentes/jovens, como suicídio e escarificação do corpo. Depressão englobou trabalhos que discutiram especificamente esta patologia e Família incluiu pesquisas sobre a relação da família em articulação com o sofrimento psíquico.

 

  1. Saúde

 

Pesquisas com temas que abarcam adolescentes/jovens acometidos por doenças, os serviços de saúde e atendimento para este público. O subtema mais recorrente foi HIV-AIDS, concentrando trabalhos que debateram conhecimento, atitudes, representações e vivência da patologia. Essas discussões perpassaram todas as categorias que focaram em alguma doença, como no segundo subtema predominante, Câncer, seguido de Obesidade, com pesquisas sobre hábitos alimentares e os discursos sobre obesidade. Outros subtemas foram: Saúde Mental (como é percebida ou vivida a saúde/doença mental entre adolescentes/jovens), Diabetes (adolescentes/jovens diabéticos), Sono (pesquisas sobre distúrbios e hábitos de sono entre adolescentes/jovens), Menarca (buscou compreender a relação entre menarca e estresse) e Hospitalização (investigou a relação dos profissionais com adolescentes/jovens hospitalizados).

 

  1. Educação

 

Teses/dissertações com foco na relação de adolescentes/jovens com ensino, escola e/ou universidade; a questão da aprendizagem e do desempenho escolar; relacionados com a Psicologia Escolar, área da Psicologia que se articula com a educação. Entre os subtemas desta categoria, três apareceram em maior número: Relação Professor-Aluno, Subjetividade e Vida Escolar. O primeiro congregou teses/dissertações que visavam a essa relação no contexto escolar e universitário. O segundo concentrou pesquisas focadas nos aspectos psíquicos relacionados à aprendizagem, vida escolar ou universitária. O terceiro contemplou trabalhos que discutiam as relações com a escola, a vida na escola, a permanência e as experiências neste contexto. Também foi expressivo o subtema Vida Universitária, agrupando trabalhos similares ao subtema anterior, mas no contexto universitário. Outros subtemas foram: Habilidades, com teses/dissertações que estudaram aspectos como leitura, escrita, aprendizagem; Família, discutindo a relação e a influência da família na vida escolar ou universitária, ou na aprendizagem; e, Psicopatologia, que concentrou trabalhos nas patologias no contexto educacional.

 

  1. Política

 

Trabalhos que debatem adolescentes/jovens e participação social e política, movimentos sociais, direitos humanos e cidadania. O subtema mais presente foi Participação, com teses/dissertações que investigam participação de adolescentes/jovens em trabalhos sociais, movimentos sociais e estudantis. Cidadania, segundo subtema mais recorrente, reuniu pesquisas sobre conhecimento dos direitos e exercício da cidadania. Liberdade refere-se aos trabalhos sobre a experiência de liberdade ou sua representação por adolescentes/jovens. A discussão sobre direitos humanos ou direitos de adolescentes/jovens está contida em Direitos. Meio Ambiente apresenta teses/dissertações que abarcam práticas e discursos sobre meio ambiente pelos adolescentes/jovens. Outros subtemas foram Maioridade Penal, que englobou trabalhos debatendo legislações referentes à temática; e, Espaço Público, que pesquisou a relação dos adolescentes/jovens com este espaço.

Márcia Stengel marciastengel@gmail.com

Doutora em Ciências Sociais pela Universidade Estadual do Rio de Janeiro (UERJ), com pós-doutorado em Educação pela Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG), Mestre em Psicologia Social pela mesma instituição. Professora do Programa de Pós-graduação de Psicologia da Pontifícia Universidade Católica de Minas Gerais.

Juarez T. Dayrell juareztd@gmail.com

Doutor em Educação pela Universidade de São Paulo (USP), com pós-doutorado no Instituto de Ciências Sociais da Universidade de Lisboa (ICS). Professor associado da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG), e pesquisador do CNPq (Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico). Fundador membro do Observatório da Juventude da UFMG.