Entrevista de Simone Peres com Electra González
Simone Peres – Você poderia contar um pouco de sua formação e sobre como chegou a esta área da saúde sexual e reprodutiva?
Electra González – Minha chegada à área da saúde sexual e reprodutiva foi bastante fortuita. Eu concorri a um cargo de Assistente Social para integrar uma equipe com gineco-obstetras e parteiras em um projeto-piloto pioneiro de atenção para adolescentes grávidas, gerido no Departamento de Obstetrícia e Ginecologia do Hospital Clínico da Universidade do Chile, o qual era liderado pelo Dr. Ramiro Molina. Eu vinha da atenção primária, sem nenhuma formação nem em adolescência nem em saúde sexual e reprodutiva, temáticas totalmente invisíveis nos anos 80, no Chile. Isso obrigou-me a autoformar-me inicialmente e depois, de maneira mais formal, fiz uma pós-graduação na Universidade de Exeter, Inglaterra, depois em CEDES, em Buenos Aires, e também no Colégio de México, no México. Além de participar de diversos encontros e congressos tanto nacionais quanto internacionais que abordavam essas temáticas.
Simone Peres – Em um trabalho recente de sua autoria, você analisa o “Embarazo repetido en la adolescencia en la realidad chilena”. Você pode falar um pouco sobre esse problema da gravidez reincidente entre adolescentes?
Electra González – A gravidez repetida ou reiterada na adolescência é uma temática ainda não resolvida no Chile e um desafio para as políticas públicas de saúde na adolescência. Durante os últimos anos, estamos muito preocupados em reduzir a gravidez das adolescentes. Mas não temos colocado ênfase em determinantes sociais que causam a primeira gravidez e que continuam presentes na vida dos adolescentes. Considerando que essas adolescentes já passaram pelo sistema de saúde, tiveram oportunidades de fazer controles, tiveram contato com a assessoria em métodos anticoncepcionais, é importante analisar em que aspectos as políticas estão falhando.
São múltiplos fatores, sem dúvida, entre os quais podemos citar: quanto menor a idade em que foi mãe na primeira vez, maior a probabilidade de que volte a engravidar, devido ao fato de que estaria mais tempo exposta ao risco de atividade sexual; baixa autoestima; consumo de drogas; histórico de mau desempenho escolar, que, ao mesmo tempo, não motivaria a seguir no sistema escolar; baixas aspirações futuras; assumir que uma fase da vida termina e começa com a chegada do primeiro filho; conviver ou casar com o progenitor do filho aumenta as probabilidades de voltar a engravidar.
Além disto, tem grande importância o fato de não usar ou usar de modo irregular os métodos anticoncepcionais no pós-parto, pois o acesso a serviços anticoncepcionais em si mesmo não diminui as taxas de gravidez na adolescência se isso não é combinado com o reforço de metas educacionais claras e um apoio no cuidado com os filhos. Esse último pode ser feito pela escola, pela família ou pelos programas especiais. Estou ciente de que esta é uma tarefa complexa que significa investir um montante de recursos financeiros e profissionais. O que até agora não parece ser uma prioridade, sobretudo em países em desenvolvimento, onde, sem dúvidas, ainda há prioridades mais urgentes para resolver.
Por isso é que, se os recursos são escassos, deveríamos investi-los mais na prevenção da primeira gravidez. De um lado, implementando programas de educação sexual integral nas primeiras etapas do sistema escolar e através do período escolar todo, e, por outro lado, fortalecendo os serviços anticoncepcionais integrais, acessíveis e confidenciais voltados para adolescentes ativos sexualmente ou em prenúncio de sê-lo.